pedra sobre pedra

Data 23/06/2009 12:45:33 | Tópico: Poemas

Oh pedras, oh pedras,
oh pedras dos meus avós,
aldeias de Portugal;

oh antigas chuvas,
pedras de antanho:

pela distância que de vós guardo,
pelas memórias de lenços, de luto,
pelos silêncios;

por um triste povo ancorado,
acossado pelo desnorte;

pelas suas cristalinas vozes
ecoando na montanha,

por um País antigo,
de cabelos tapados,
em tristeza enterrado;

-Deixai-me agora falar,
deixai-me
- que tanto impedir já mais não possas -
e recordarei hoje
o que pelo Mundo busquei.

Por calçadas e pavimentos,
por viadutos e pontes,
por esperados encantamentos,
pelas novas vias largas...

Ah, meu povo
que sobre pedras permaneces,
em teimosas lembranças,
em abafadas vozes.

Oh pedras do Norte,
granitos galegos:
de ti vêm meus olhos cinzentos

que para bem longe de ti os levei,
que hoje mais aguados trago,
que hoje aguçados os levo
pelas geadas, nortadas
e granizos de pedra, de pedra.

Sim, povo meu,
que me não estranhaste
tanto quanto eu
a ti...
...e se em tempos de gesta,
tempos sinceros,
me encantaste,
hoje nas minhas rugas
trago as mesmas amarguras.

Sim, meu povo,
sobre pedras nos sentamos
- sobre as mesmas
em que sempre ficámos
depois de cada batalha...

Ah, povo de pedras
- já poucos restamos
indagando o horizonte;
indagando este chão,
agonizante...

Aqui, sobre os nossos campos,
pedra sobre pedra,
ninguém impedir-nos se atreve
de soltarmos azedumes na verve...

Porém vai o sol já perto do ocaso
e falar já não me apetece...


(5/6/09)


Este texto vem de Luso-Poemas
https://www.luso-poemas.net

Pode visualizá-lo seguindo este link:
https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=88044