BURROS

Data 05/08/2009 13:53:07 | Tópico: Textos

BURROS




Áh burro dum cabrããão!!!....Não tens olhos nesse fociiiinho?.... Vá...Vai o ao rego, vai!!!... Não querem lá ver o filho duma mula?...vá, toca a andar!....Mas será que este caga esterco, não sabe o que é um rego?...óh pá!!!... não me faças desatinar, que senão tenho que te desancar o pêlo!...óuuu!..aí sua beeeesta!!!...Vá!...Vira á esquerda!...ó meu corno, então a esquerda é práíííí?...
Não se lembrando que quando fora militar, também não sabia qual era a esquerda e a direita, continuou os seus impropérios....
Andas cheio de vício, é?...Mas eu já to tiro...burro dum sacana!!! Ai tiro, tiro!!! Mas tu pensas que é algum empregado do estado, para parares quando queres?!!!...anda lá, meu cabrão!!!...Não querem lá ver isto?...Estou cagádo com este gajo!!!....Vá lá, anda, antes que te rebente com o bandulho!!!
-Isto ouvi eu, olhando um pequeno burro, que puxando um arado, ia também ele, ouvindo estes e outros impropérios do agricultor.
Talvez ofendido, por tanto ser achincalhado, ou pelo cansaço, o burro parou de vez.
Talvez também cansado, o agricultor, acalmou e puxando de um cigarro, e passeando á volta do burro, ia-lhe passando a mão pelo lombo suado, como se aquela carícia, o convencesse a acabar o rego.
Fez-lhe uma festa no focinho, e olhou o burro nos olhos...
Eram uns olhos tristes, e neles viu os seus.
Apagado o cigarro, o agricultor tornou a pegar no cabo do arado, e ignorando propositadamente a vara com que vergastava o pequeno animal, disse-lhe então numa voz agastada:
Anda lá homem, porque o burro aqui, sou eu!!!
Foram como que palavras mágicas, pois quer fosse o homem, quer fosse o burro, começaram a andar.
Eu, que nada dissera, senti que era o mais burro de entre eles, e segui o meu caminho, como se fosse um rego.
.Nos ouvidos ressoavam-me os impropérios do agricultor...Anda burro dum cabrão!!!
Passados meses, passei por lá.
O cenário era quase o mesmo, com os mesmos impropérios, apenas com mais duas mulheres já de idade, que curvadas sobre os tais regos, apanhavam batatas.
Não parei, mas consegui ainda para ouvi-las dizer: Se tivéssemos aprendido a ler, talvez hoje, não andássemos aqui curvadas como duas burras.



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