RITOS FINAIS

Data 30/08/2009 12:32:14 | Tópico: Poemas

pintas camaleões nas folhas secas do meu jardim de outono
fazes muito bem
só peço-te não machuques o peixe-espada
que não sabe mais esgrimir porque o tornaste
durante um século prisioneiro
no aquário escuro das nossas lembranças

preparas os sais e os aromas para o ritual do teu banho
tão logo os primeiros galos acordem a manhã
anunciando a minha morte
fazes muito bem
só peço-te não apagues do meu rosto as chuvas
que caíram pesadas em londres ou paris
- não me lembro ao certo -
naquele ano de 1911 quando eu vivia de tocar violino
nas gares em troca de moedas para garantir miseráveis côdeas de pão e uma parte de vinho

ajeitas o trapézio no ponto mais alto que a tua imaginação convém
fazes muito bem
só peço-te para fechar os olhos
quando eu cair estatelado no asfalto
depois da vigésima quinta pirueta
sem que nenhum aplauso me faça despertar
aí então aproxima-te do que de mim ficou e cobre o meu silêncio
com os sorrisos e as cinzas que juntaste
ao longo dos nossos quarenta e quatro últimos carnavais
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júlio


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