Preciso de ar, estou a sufocar!

Data 17/06/2007 18:33:12 | Tópico: Textos -> Tristeza

Agora, a olhar o céu escuro à procura de uma estrela que seja, dei conta que já se passaram algumas horas depois de saber a noticia e que a estrada que percorri, para chegar até esta pequena Capela que está ao meu lado, pareceu-me infindável. Acho que chegou o momento, vou entrar por aquela porta antiga, com o verniz pálido das agressividades dos anos, para te ver.
Aproximo-me da entrada e vejo o teu caixão que me parece estar tão desprotegido. Deixo os passos pesados me arrastarem para onde o silencio a choro é perturbador.
- Raquel? Raquel? Não ouves? Estou a chamar-te neste tom murmurado enquanto passo os lábios pela tua testa, numa estúpida tentativa de te trazer de volta à vida, de retorno a este lugar que agora me parece ainda mais sem sentido e que todos teimam em chamar de mundo.
Já vi que não me ouves, que não te importas com o meu sofrimento e que agora és só tu nesse teu mundo novo de fantasias ou pesadelos. Preciso de me sentar tenho as pernas a tremer, acho que estão quebradas pois não tenho força para as suster debaixo do meu corpo.
- Ai Deus, o que faço eu aqui sentada nesta sala tão fria? Sinto-me a desfalecer aqui nesta cadeira corroída pelo tempo. Dói-me a cabeça. Os pensamentos estão tão soltos que nem sei o que penso neste instante.
Num gesto de desanimo dobro o tronco para a frente, apoio os cotovelos nas pernas e deixo cair a cabeça até a sentir pendurada sobre o pescoço. Numa nova tentativa para te ver ergo os olhos e apenas consigo observar os rostos desalentados da tua família, dos teus amigos, dos nossos amigos e sobretudo, dos teus pais. Apenas me ocorre a ideia de lhes ir falar, mas perco a coragem ao ver a tua mãe a lutar para contornar a dor que sente. Sim, aquela dor que tanta vez tu me disseste que era impossível alguém sentir... a tua mãe está a senti-la neste momento e eu também estou. É uma dor perfurante que entra dentro dos meus sentidos e me faz ficar sem eles, é uma dor alucinante que me faz sentir o coração a pulsar mais e mais como se fosse explodir e sufocar ainda mais o peito que me aperta os pulmões e os esmaga até ficarem sem ar.
Como me pudeste fazer uma coisa destas? Como pudeste morrer? Eu sei que a vida é injusta, tudo é injusto quando a justiça divina, ou o que quer que lhe chamam, teima em aparecer junto de nós para nos fazer ver que o que aconteceu não foi por um acaso. Qual foi o acaso que te levou para sempre desta vida?
Sabes apesar de estares no outro lado da vida não creio que estejamos separadas, afinal a morte não separa ninguém.
Preciso de ar, estou a sufocar!


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