
PENSANDO NA AUSÊNCIA DE HILDA HILST E SOPHIA BREYNER
Data 08/09/2009 23:52:20 | Tópico: Poemas
| Para Margarete e Xavier Zarco, meus amigos
"Soergo o meu passado e o meu futuro E digo à boca do Tempo que o devore." (Hilda Hilst, Júbilo, Memória no Noviciado da Paixão)
"As pessoas sensíveis não são capazes De matar galinhas Porém são capazes De comer galinhas" (Sophia de Mello Breyner Andresen, Obra Poética, volume II)
não sei se a hora do brasil teve o caráter de noticiar a morte de vocês...
quando você morreu sophia meu amigo o poeta álvaro alves de faria se trancou num quarto de um hotel em lisboa e transformou seu exercício de morrer num livro eu não conheci você sophia e só soube de você pelos olhos claros que faziam meu olhar vagabundo de homem ir além da poesia hilda também tinha os olhos claros era malcriada e me fazia ir além da poesia quando numa noite bêbada me pediu que lesse em sua casa os seus poemas de amor recusados por um editor
é duro não poder ter intimidade direta com deus e cobrar dele: mulher não foi feita pra envelhecer ainda mais quando faz poesia e mais ainda quando tem os olhos verdes mulher é feita pra parir diz minha faxineira nordestina com seu "graças-a-deus" na ponta da língua tão orgulhosa dos filhos que tem a cara de fome pouco importa é mãe limpa todas as sextas-feiras o canto onde escrevo apinhado de livros garrafas de bebida pontas de cigarro papéis velhos rabiscados pergunta com seu sotaque arrastado o que quero pro almoço sem querer respondo quero hilda bem passada na brasa e os olhos de sophia no ponto ela não entende nada põe o bife de fígado na frigideira pergunta se eu quero batatas eu respondo que pode ser o telefone toca e o dia acorda bem alto
(não sei que dia é hoje. a conta de luz está vencida. tenho obrigações a cumprir de homem da casa) ___________
júlio, in Homenagens
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