Ausência

Publicado em 16/03/2023 23:59:57 | Tópico: José Bonifácio de Andrada e Silva - O moço


Pode o Fado cruel com mão ferrenha,
Eulina amada, meu encanto e vida,
Abafar este peito e sufocar-me!
Que pretende o Destino? em vão presume
Rasgar do meu o coração de Eulina,
Pois fazem sós um coração inteiro!
alma impressa,
Tu desafias, tu te ris do Fado.
Embora contra nós ausência fera,
Solitárias campinas estendidas,
Serras alpinas, áridos desertos,
Largos campos da cérula Amphitrite
Dois corpos enlaçados separando,
Conspirem-se até mesmo os Céus Tiranos.
Sim, os Céus! Ah! parece que nem sempre
Neles mora a bondade! Escuro Fado
Os homens bandeando, como o vento
Os grãos de areia sobre a praia infinda
Dos míseros mortais brinca e os males
Se tudo pode, isto não pode o Fado!
Sim, adorada, angelical Eulina.
Eterna viverás a esta alma unida,
Eterna! pois as almas nunca morrem.
Quando os corpos não possam atraídos
Ligarem-se em recíprocos abraços,
(Que prazer, minha amada! O Deus Supremo,
Quando fez com a voz grávido o Nada,
Maior não teve) podem nossas almas,
A despeito de mil milhões de males,
Da mesma morte. E contra nós que vale?
Do sangrento punhal, que o Fado vibre,
Quebrar a ponta; podem ver os Mundos
Errar sem ordem pelo espaço imenso;
Toda a Matéria reduzir-se em nada,
E podem ainda nossas almas juntas,
Em amores nadar de eterno gozo!

Em Paris, no ano de 1790
Publicado no livro Poesias Avulsas de Américo Elísio (1825).



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