
Vinte poemas de amor - XX
Publicado em 23/11/2008 12:30:00 | Tópico: Pablo Neruda
| Vinte Poemas de Amor – XX
(tradução de Fernando Assis Pacheco)
Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Escrever, por exemplo: "A noite está estrelada, e tiritam, azuis, os astros lá ao longe".
O vento da noite gira no céu e canta.
Posso escrever os versos mais tristes esta noite. Eu amei-a e por vezes ela também me amou.
Em noites como esta tive-a em meus braços. Beijei-a tantas vezes sob o céu infinito.
Ela amou-me, por vezes eu também a amava. Como não ter amado os seus grandes olhos fixos.
Posso escrever os versos mais tristes esta noite. Pensar que não a tenho. Sentir que já a perdi.
Ouvir a noite imensa, mais imensa sem ela. E o verso cai na alma como no pasto o orvalho.
Importa lá que o meu amor não pudesse guardá-la. A noite está estrelada e ela não está comigo.
Isso é tudo. Ao longe alguém canta. Ao longe. A minha alma não se contenta com havê-la perdido.
Como para chegá-la a mim o meu olhar procura-a. O meu coração procura-a, ela não está comigo.
A mesma noite que faz branquejar as mesmas árvores. Nós dois, os de então, já não somos os mesmos.
Já não a amo, é verdade, mas tanto que a amei. Esta voz buscava o vento para tocar-lhe o ouvido.
De outro. Será de outro. Como antes dos meus beijos. A voz, o corpo claro. Os seus olhos infinitos.
Já não a amo, é verdade, mas talvez a ame ainda. É tão curto o amor, tão longo o esquecimento.
Porque em noites como esta tive-a em meus braços, a minha alma não se contenta por havê-la perdido.
Embora seja a última dor que ela me causa, e estes sejam os últimos versos que lhe escrevo.
Pablo Neruda
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