Poesia não se faz com luvas de pelica

Data 19/10/2009 19:39:08 | Tópico: Poemas -> Para Visitantes

Eu ando descalça entre os cacos de vidro
Que não cortam mais que a hipocrisia da humanidade
Eu me afogo em copos de cachaça
E vomito os valores num dia de sanidade.

Eu cansei dos poemas emoldurados
“Lindos”, como diplomas pregados na parede
Eu canto com os analfabetos
Eu estou com o Sertão na fome e na sede.

Que se coloque um vestido vermelho na “virgem” Maria
Que se conte a verdadeira história
E quem há de defender a “santa” inquisição?
O que se apagou da memória?
O câncer do mundo sempre foi a religião.
Guerras santas, guerras antas, antas santas...
Quantas?

Eu escrevo sobre o que acredito
Não sobre o que convém
Eu não posso tirar as luvas de pelica
Sem ferir ninguém.

Eu cansei dos poemas de amor
Eu cansei dos sorrisos sem dentes
Eu cansei das novelas de finais felizes
De ignorar as feridas latentes.

Que se tire o esparadrapo do machucado abafado
E que se jogue álcool no pus
O choro há de lavar as faces
Desse meu povo pregado na cruz.

Vou levar minha poesia para a rua
E dormir com ela na calçada
Brigar por um pedaço de pão
Correr dos tiros na madrugada.

Eu vejo os passarinhos presos nas gaiolas
Os homens presos na alienação
A juventude presa nas escolas
Fantoches da programação.

Hei de dar a minha cara a tapa
Aprender malabarismo
Andar sobre as marquises
Sentir a gula do capitalismo
A fome do comunismo.

Há de se gritar até estourar os tímpanos do Brasil
Farrapos, esfarrapados, esfomeados
Retirantes, sem terra, sem renda
Exilados e torturados.

Há de se berrar até estourar os tímpanos do mundo
É o coro dos miseráveis
Africanos, afegãos, brasileiros...
É para quebrar os sorrisos amáveis.

Que se gritem as verdades
As injustiças, as falsidades...

Programas assistencialistas, super-populão, poluição...
Democracia obrigatória – votação
Sinta a minha ferida que queima no peito
Nenhuma palavra há de conseguir transmitir minha aflição.
Que Carlos Prestes e Pagú perdoem...
Essa minha geração.



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