
Discussão Doméstica
Data 09/10/2010 16:16:32 | Tópico: Contos
| Às sete da noite, uma ventania causou a queda de energia naquele apartamento (e nos demais, é óbvio). Bento desligou o seu computador, bufando. Lia largou o que estava fazendo na cozinha e gritou de lá pra Bento: — Ei, cadê você? Me ajude a encontrar uma vela! Bento lá do seu quarto, respondeu: — Já peguei uma, espera que vou até você pra acendê-la. Chegando à cozinha, Lia olhou curiosa pra Bento e lhe perguntou: — O que você fazia na internet? —Estava jogando. Que chato ficar sem luz! O que faremos agora? Lia, num tom irônico, disse: — Por que você não me conta o seu “joguinho”? — Ora! De repente você ficou interessada em games? — Qual é o problema querer saber o que meu marido faz quando não estou por perto? — Mas você está por perto sempre quando estou jogando, só que não compartilha disso comigo. — Tá bom! Você está enrolando e até agora não me respondeu! — O quê? Já respondi sim senhora! Faço isso todos os dias e não entendo o porquê da pergunta! — Não quer responder, ok. Mas não me enrole! — Vamos ficar aqui discutindo? — É. Vamos sim. — Vou pegar mais vela e colocar no nosso quarto. — Daqui a duas horas volta... é sempre assim! Lia desabafa. — Você quer saber por que eu gosto tanto de ficar jogando no computador? — Se você quiser falar... — É porque me esqueço da minha rotina e relaxo! — Eu faço parte da sua rotina, né? — É. Por quê? Não ficou chateada com o que eu disse né? — Não! Imagina! Apenas sinto que meu marido prefere jogar a ficar comigo. — Que isso? Você está sendo injusta! Eu jogo quando você não me dá atenção ou está fazendo alguma tarefa doméstica. — Tá bom! Não vamos começar de novo a discutir, né? — Eu nunca começo uma discussão. É sempre você! — Sim... porque você só quer saber de ficar na frente do computador jogando... — Não é verdade! Quando chego do trabalho, ou você está ao telefone com uma amiga ou fazendo não sei o quê na cozinha! — Tá Bento! Chega, ok! Vamos ficar em silêncio? —Poxa! Estou dialogando com você... está bem, é melhor mesmo! — Que bom! Os dois permaneciam em pé, encostados no armário da cozinha, olhando pra chama do fogo, pensativos. De repente, Lia olha pro relógio pendurado lá na parede e exclama: — Afff! Ainda falta uma hora e meia! — Pois é. Devemos ter paciência. Afirma Bento. — Eu sou a pessoa mais paciente desse mundo, Bento! Estou casada com você há sete anos! Hahahahahah!! — Nossa! Que declaração de amor, hein?! — O amor é paciente. Que foi? Não gostou do que eu falei? — Não! Às vezes, você é bem dura! — Mas você deve gostar, já que ainda está casado comigo. — Não é isso não, meu amor, é que também sou paciente com seus defeitos. — Não somos iguais! Posso ter defeitos, mas sou bem mais paciente que você. E tem outra coisa: Estou cansada de suas ironias. — Agora eu é que sou o irônico? Você é engraçada! Gosta das coisas do seu jeito e detesta ser contrariada. — Se eu não gostasse de ser contrariada, não teria me casado com você! — Ah! Então você gosta? — Não enche! — Não agüento mais ficar discutindo a relação com você! É entediante! Parece que a hora não passa! — Pelo contrário! Agora falta somente uma hora pra energia voltar. — Você faz de propósito? — Eu? O que? Não entendi. — Impossível vencer você em uma discussão. — Humm... você acha mesmo? Isso é um elogio? — Não, uma crítica! Pois você sempre arruma um motivo qualquer pra brigar comigo... me criticar...me colocar contra a parede! — Quando é que lhe coloquei contra a parede, seu idiota? — Hoje mesmo. Há alguns minutos. Não consigo relaxar quando estou verbalizando com você! — Espera a energia retornar e volta lá pro seu joguinho, então. Por que você não se muda pro escritório? — Por que você não cala essa sua boca? — Tá bom, vou calar. — Preciso ficar em paz, estou cansado. Hoje foi um pouco estressante no trabalho. — Mas nada como um joguinho no computador, né?! Como você é infantil! — E como você é preconceituosa! — Não é questão de preconceito, só queria chegar em casa e encontrar um homem e não um menino. — Pra onde você foi? Está sempre em casa! Só sabe reclamar, e de boca cheia! — Fui às compras à tarde. Procurei tudo do que você gosta, preparei uma sobremesa gostosa pra quando você chegasse..., mas bem na hora que eu ia pô-la no forninho, a luz escafedeu-se! — Poxa, amor, que legal! Obrigado. Aproximando-se e beijando Lia na boca. — De nada! Afinal, pra isso servem as esposas! — Oh! Amor! Só que nem todas são assim como você, dedicadas e amorosas. Tascou-lhe outro beijo. Lia dessa vez, retribuiu-lhe com mais ardor. — Te amo, Lia. — Também. E, por fim, fizeram amor ali mesmo, no chão da cozinha.
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