Tempo de pagar o tempo.

Data 21/07/2011 15:06:15 | Tópico: Poemas -> Introspecção



Hoje é o meu dia triste.
A mala está organizada e a comida está salgada.
Dói-me os dedos de tanto rapar e tentar descobrir restos para comer.
Supermercado? Longe vão os tempos. Escasseia o dinheiro na carteira.
Sou sempre eu! Olho-me no espelho e vejo-me desaparecer.
Sou uma donzela que mais parece um pavio de uma vela gasta.
Rasca é a minha existência.
Paciência! O pão serve de alimentação.
As notas voaram em tempos e os trocos dominam a razão.
Queira tanto ser rica! Comer em abundância. Sonhar em Lisboa e acordar em França.
Marmitas da Louis Vuitton , com o monograma contrafeito que me faz lembrar outro mundo.
Uns têm tudo! Outros nada têm. Mas na certeza porém, os maus tempos advêm de outros ainda piores.
O meu escadote foge-me por entre os dedos deixando os seus degraus cederem ao meu peso, peso leve que só me obriga a descer.
Sonho que me faz levitar.
Os meus pés apertam-se, tentam encaixar-se dentro de um par de sapatos esburacados que por sinal não são maleáveis.
Troquei a calculadora pelos nós dos meus dedos. Roupa miserável que vagabundeia pela classe média.
Eterno pagador de esmolas que nunca vê a promessa cumprida e marcha ao lado de uma estrada sem bermas. Só valetas que não fazem falta!
Miséria que desfila pela avenida. Poeta sem papel que decorra as palavras.
Parcas mas certeiras.
A manteiga deu lugar à margarina e a varina abandonou a lota.
Trabalha na terra mais o seu marido. Curto e comprido, palavras lançadas ao vento. Nomes do seu descontentamento. Leva-los cotovia. Leva-los vento e fá-los aterrar lá para o lado de Sº Bento.
Abandono a alegria, ofereço-a à minha barriga vazia.
Que triste conta certa sem lugar a demasia.
Calças presas nas meias para as migalhas não perder.
Bolsos rotos pela força dos dedos que tentam em vão encontrarem salvação.

2 e 2 quantos são?


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