
[… e ouvi alguns velhos do restelo clamando
Data 31/05/2012 05:32:41 | Tópico: Poemas
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… e ouvi alguns velhos do restelo clamando; “Que famas lhe prometerás? que histórias? Que triunfos, que palmas, que vitórias?”,
e vi duas sílfides dançando por entre o perfume das flores em primavera, levando e trazendo suaves brisas,
e vi alguns poetas queimando palavras incrustadas em folhas preenchidas, outros não riam, outros viravam as costas ao caminho,
e ouvi militares alteando a voz, encurralados na ilha de Kheros; “Antiguidade é um posto, antiguidade é um ...”,
ah... e mais vi, e mais ouvi, declamavam-se elogios, e mais elogios, como se a salvação fosse aqui tão perto; - vai-te anjo rebelde expulso dos céus, expurgo-te do amanhã, do hoje, do sempre, “rasteja para a terra, possa ela salvar-te do nada”,
e alguns fizeram as pazes, mesmo com os dedos cruzados atrás das costas, alguns suspiraram não sei o porquê, outros guardaram as adagas de istambul ainda a brilhar, libertaram-se os cheiros da amêndoa e do café.
E tudo vi, e tudo ouvi, seria esperança, seria morte, seria o fim das trevas [?],
não sei,
sei que ainda ficou uma sílfide, dançando por entre o perfume das flores em primavera,
[e o silêncio anoiteceu-me a voz, jamais o poema],
... [que por aqui deposito? jamais].
Velho do Restelo – simbolizava o pessimismo, o conservadorismo. Personagem criada por Luis de Camões em “Os Lusíadas”, canto IV:
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Mas um velho, de aspecto venerando, Que ficava nas praias, entre a gente, Postos em nós os olhos, meneando Três vezes a cabeça, descontente, A voz pesada um pouco alevantando, Que nós no mar ouvimos claramente, C'um saber só de experiências feito, Tais palavras tirou do experto peito:
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- "Ó glória de mandar! Ó vã cobiça Desta vaidade, a quem chamamos Fama! Ó fraudulento gosto, que se atiça C'uma aura popular, que honra se chama! Que castigo tamanho e que justiça Fazes no peito vão que muito te ama! Que mortes, que perigos, que tormentas, Que crueldades neles experimentas!
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- "Dura inquietação d'alma e da vida, Fonte de desamparos e adultérios, Sagaz consumidora conhecida De fazendas, de reinos e de impérios: Chamam-te ilustre, chamam-te subida, Sendo dina de infames vitupérios; Chamam-te Fama e Glória soberana, Nomes com quem se o povo néscio engana!
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- "A que novos desastres determinas De levar estes reinos e esta gente? Que perigos, que mortes lhe destinas Debaixo dalgum nome preminente? Que promessas de reinos, e de minas D'ouro, que lhe farás tão facilmente? Que famas lhe prometerás? que histórias? Que triunfos, que palmas, que vitórias?
Sílfide – (s.f.) Do latim sylphus-génio. Génio fantástico do ar, que habitando nos bosques vivia do perfume das flores. De origem oriental, era invocado pelos cabalistas na Europa. Do sexo feminino de corpo belo, leve, grácil e veloz, com quem são comparadas as melhores bailarinas.
Ilha de Kheros – Localizada na Turquia. Filme “Os Canhões de Navarone” realizado por J. Lee Thompson. Óscar em 1962 na categoria de melhores efeitos especiais.
“rasteja para a terra, possa ela salvar-te do nada”- texto védico que e dirige ao morto, Rig Veda X, “Rasteja para a Terra, tua Mãe! E possa ela salvar-te do nada”
… [“do ciclo, as palavras não têm prazo de validade. “ Riva la filotea. La riva? Sa cal'è c'la riva?” (Está a chegar. A chegar? O que estará a chegar?)]
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