
FILHO DO CREPÚSCULO
Data 07/12/2007 15:12:32 | Tópico: Poemas -> Tristeza
| FILHO DO CREPÚSCULO
A
Sigo o itinerário da vida, sabendo ser guiado intimamente até agora pela bruma da desventura por sina. B
Quando embrião da tenra aurora, ao primazial impacto, não do reflexo dos raios emanados da ígnea estrela, que esse fora bálsamo, mas do da daninha luz dos homens, senti calcinar-me o olho da compreensão um dos muitos e inefáveis veios da centelha da atroz razão.
C
Doera-me muito a primeira botada desferida, no entanto, como a maioria das crianças que se fere na perna e sofre um breve processo de cicatrização, a assimilei quase prontamente, retomando a trilha da via temerária e pungente do meu coração. D
Parece haver um magnetismo entre mim e o malogro: uma força que me impele a ir a seu encontro. Tenho relutado muito não querendo ceder á recalcitrante potência que irrevogavelmente quer ao fosso do desespero me arrastar, com veemência, mas agora, que vejo chegar o hausto de minhas têmperas, pondero sobre se há sentido em continuar seguindo o curso das querelas que estou acostumado a travar ao longo da minha existência ...
E
Começo a pensar que a letargia de tudo deveria se abater sobre meu ente egocêntrico e gradativamente me fosse falindo a matéria até a hora do definitivo ocaso na Terra. F
Ah, como gostaria, antes disso, de pegar um trem numa estação alhures que seguisse uma rota de regresso áquele parque bucólico onde morava. Ver as folhas das amendoeiras a se esparramar pelo chão de mata. Colher nicuris ao verter do céu escarlate. Ir á casa da vó Julieta. No casebre que ti- nhamos, jazer na sala e sentir o comichão que me dava o piso cor de cereja. Com meus amigos, Chiquinho e Lucas, por ter medo de fantasma, me esconder na garagem cimentada sob a égide da trançada esteira. Ah, o quão queria voltar no tempo e reacender a perdida chama da ingenuidade verdadeira! H
Infelizmente nada disso é-me mais possível, pois a forma sólida da água onírica que me jaz nas mãos, se liquefaz e me escapa pelos dedos baldios. Impotente, a olho com olhos de fel: olhos cheios de rance- níase da paixão. Olhos insanos de nenhuma emoção. Afinal, vejo um varão misantropo. Um varão transmudado em desgosto. Um varão amargo. Um varão vazio. Menos que um varão, com toda certeza, afirmo!
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