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FILHO DO CREPÚSCULO

 
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FILHO DO CREPÚSCULO

A

Sigo o itinerário da vida,
sabendo ser guiado intimamente até agora
pela bruma da desventura por sina.
B

Quando embrião da tenra aurora,
ao primazial impacto, não do reflexo dos raios
emanados da ígnea estrela,
que esse fora bálsamo,
mas do da daninha luz dos homens,
senti calcinar-me o olho da compreensão
um dos muitos e inefáveis veios da centelha da atroz razão.

C

Doera-me muito a primeira botada desferida,
no entanto, como a maioria das crianças que se fere
na perna e sofre um breve processo de cicatrização,
a assimilei quase prontamente, retomando a trilha
da via temerária e pungente do meu coração.
D

Parece haver um magnetismo entre mim e o malogro:
uma força que me impele a ir a seu encontro.
Tenho relutado muito não querendo ceder á recalcitrante
potência que irrevogavelmente quer ao fosso do desespero
me arrastar, com veemência,
mas agora, que vejo chegar o hausto de minhas têmperas,
pondero sobre se há sentido em continuar seguindo o curso
das querelas que estou acostumado a travar ao longo da
minha existência ...



E

Começo a pensar que a letargia de tudo
deveria se abater sobre meu ente egocêntrico
e gradativamente me fosse falindo a matéria
até a hora do definitivo ocaso na Terra.
F

Ah, como gostaria, antes disso,
de pegar um trem numa estação alhures que seguisse
uma rota de regresso áquele parque bucólico
onde morava. Ver as folhas das amendoeiras
a se esparramar pelo chão de mata. Colher nicuris ao verter do céu escarlate. Ir á casa da vó Julieta. No casebre que ti-
nhamos, jazer na sala e sentir o comichão que me dava o piso
cor de cereja. Com meus amigos, Chiquinho e Lucas, por ter medo de fantasma, me esconder na garagem cimentada sob a égide
da trançada esteira. Ah, o quão queria voltar no tempo e reacender a perdida chama da ingenuidade verdadeira!

H


Infelizmente nada disso é-me mais possível,
pois a forma sólida da água onírica que me jaz nas mãos,
se liquefaz e me escapa pelos dedos baldios.
Impotente, a olho com olhos de fel: olhos cheios de rance-
níase da paixão. Olhos insanos de nenhuma emoção.
Afinal, vejo um varão misantropo. Um varão transmudado
em desgosto. Um varão amargo. Um varão vazio.
Menos que um varão, com toda certeza, afirmo!




barbosia@zipmail.com.br


 
Autor
jessé barbosa de oli
 
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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 08/12/2007 12:31  Atualizado: 08/12/2007 12:31
 Re: FILHO DO CREPÚSCULO
Seu texto é magnífico! LIndo!