Acreditando na humanidade

Data 29/09/2013 02:57:49 | Tópico: Crónicas

O espaço é aprazível. O projeto inovador, fruto da criatividade do seu promotor, que, por desígnios superiores, talvez porque Deus goste de chamar para si as almas mais moldadas à sua imagem, já não se encontra entre nós, pobres humanos, que, ainda, por cá andamos em busca de dar um sentido à nossa vida, o que nem sempre é fácil, mas, pelo menos, tentamos levar a bom porto o objetivo a que nos propusemos, construir, com trabalho e probidade, suor e algumas lágrimas, o nosso lugar na sociedade.
Estou a falar de um estabelecimento onde a cafetaria se conjuga, harmoniosamente, em são convívio, com o comércio e reparação de bicicletas de BTT, passo a publicidade a “AniBikes”, loja de bairro, com clientela assídua, de ambiente familar, paragem de senhoras, famílias, animada pela passagem dos ciclistas que param para ver de perto os novos modelos de bikes e seus afins, tais como peças para reparação, acessórios e até bebidas energéticas. Por lá, já muitos se conhecem, interagem, e até acabam por descobrir que o mundo é pequeno e, afinal, até ainda são aparentados.
Fazendo as honras da casa, e, principalmente, honrando a memória do pai, Mamede Nazaré, a filha Inês, há muito habituada à arte do balcão, coleciona, já, no seu quotidiano, uma panóplia de episódios insólitos, achando eu, modesta contadora de histórias, que este é digno de ser partilhado, não só por ser surreal, mas pela forma astuta, inteligente e teatral como foi congeminado, não deixando margem para raciocinar ou por em causa a idoneidade de carater da sua protagonista, de aparência cuidada, cabelo e unhas acabadas de arranjar, roupa dentro dos padrões actuais da moda, e tomo a liberdade de reconstituir:
Cliente: Boa tarde! Por favor queria uma tosta mista e um abatanado com dois cafés, porque, não imagina, estou com uma enorme dor de cabeça. Enquanto me prepara o lanche, seria possível ir à casa de banho?
Proprietária: Claro, esteja à vontade.
Uma vez servida, com todos os requintes de qualidade e zelo, como é apanágio da casa, sentou-se na mesa a degustar o caprichado repasto, lembrando-se, em seguida, de que, ainda, lhe faltava algo.
Cliente: Arranje-me, também, se faz favor, uma empada de galinha para comer, agora, e seis carcaças.
Entretanto, depois de, devidamente, aconchegar o estômago, levantou-se para pagar a conta:
Cliente: Quanto é, por favor?
Proprietária: São quatro euros e oitenta cêntimos.
Cliente: Afinal, não trago dinheiro na carteira e julgava que trazia. Posso pagar com o cartão?
Proprietária: Claro que sim!
Inesperadamente, como por vezes, no melhor pano cai a nódoa, o cartão, depois de várias tentativas, manteve-se, coerentemente, inibido. Aí, a senhora, de aspeto indubitável, perguntou:
Cliente: Olhe, vou ali a casa, num instante, buscar o dinheiro. Ficam aí as carcaças!
Uma semana depois, as carcaças, já nem para sopas de café com leite servem .

Maria Fernanda Reis Esteves
53 anos
natural: Setúbal



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