Valsa sepulcral

Data 28/10/2013 16:52:25 | Tópico: Poemas



Esfuziantes, em trapos rotos de sedas antigas,
bailavam céleres ao sabor da brisa noturna,
sobre vetustas lousas, cruzes e lápides amigas,
ao som de sinos azinavrados, melodia soturna.

Como um casal qualquer, ali rodopiando o par,
a quebrar o silêncio, sons de ossos a intrusar.

Deslizam os dois compartilhando segredos,
conjurando um amor que resistiu à morte;
ossadas alvacentas levantadas dos lajedos
como se ignorassem o que lhes deu a sorte.

Trocando palavras sobre os tempos de outrora,
havia encantos, mas não dançavam como agora

A bailar, tão branca dupla solitária deslizava;
à dama seu cavalheiro cortês, mesuras cometia;
os crânios descarnados amiúde o par colava,
cúmplice olhar emanava chão da orbita vazia.

Executavam a antiga valsa com muito regalo,
embevecidos ambos, até que cantasse o galo

Se noctívago passante mirou por indiscrição,
pelo portal da necrópole através da fresta,
vendo ossos silenciosamente mal tocando o chão,
fixos os olhos arregalados, ante visão funesta.

Arrepio teve, terror mirando tão dançante o casal,
ossos insepultos a bailarem alegres, a valsa sepulcral



Este texto vem de Luso-Poemas
https://www.luso-poemas.net

Pode visualizá-lo seguindo este link:
https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=257674