Uma carta de amor à moda antiga

Data 07/12/2014 18:15:33 | Tópico: Textos





Reconheço seu esforço. Imagino que teve tanto trabalho para escrever esta carta, mas suas palavras não puderam ser lidas. Queimei-as nas chamas do lampião de querosene. Poderia ter usado a chama de uma vela, mas não havia nenhuma calhando. Então... Se tivesse mandado um e-mail, tenho certeza que não jogaria meu note Vaio novinho na lareira. Penso que cartas são mais reais e românticas quando transformadas em fagulhas e cinzas.
Ler no papel sempre dá sono. Vislumbra-se logo de início o número de palavras que transportam a mensagem real. Acontece, na verdade, que a primeira impressão é da letra, cor da tinta, tamanho da carta, essas coisas que dão vantagem ao texto digital. Um envelope com endereço escrito sobre régua, letrinha feia de dar dó, já é um mau começo. Depois, aquelas folhas de cadernos espiral cheias de coraçõezinhos bregas, dobradas como um mapa do inferno. Meio ultrapassado, fora de modo, assim como lamber a cola o envelope para fechar. Nem falo nada sobre lamber o selo...
Mas, mesmo sem ter lido sequer uma única maldita palavra, tenho a certeza que mentiu por demais. Se bem que, na verdade, quando se tem a intenção de criar alguma falsidade, o discurso será vazio, não importa o meio. Não se criam certezas levando-se em conta o modo de enviá-las. O conteúdo sempre será considerado, mas para mim, não poderia ser mais impróprio ter transmitido pensamentos para o papel, indeléveis palavras devassáveis e de certo modo permanentes. Bom que não são resistentes às chamas.



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