Ret` alhos do dia a dia

Data 25/10/2016 16:26:15 | Tópico: Textos


Existem situações que nem ao diabo lembra, neste país a única coisa que deve funcionar é o sonho, ou a crença, (muitos vão achar um exagero, que o país até é óptimo e muito calmo), desculpem se não sou crente e se não tenho qualquer optimismo em relação a esta embófia de país. Estou a falar deste país e não a fazer comparações com outros, isto porque a bem da verdade fizeram-me acreditar que sou portuguesa por ter nascido cá. Escrevo neste momento como cuidadora, alguém que toma conta de outra pessoa há treze anos, alguém que é tratado como uma filha da puta (com todo o respeito à minha mãe), como uma encostada da sociedade, uma anualidade para o sistema e a maior ironia é criarem agora o dia nacional do cuidador. Afinal quem é o cuidador? Que faz um cuidador? Quem se preocupa com o cuidador? Para mim seria muito simples responder as estas perguntas, é tão simples como isto; o cuidador que se cuide! O cuidador que vá apanhar moscas em hora de ponta.
O sistema respeita mais os que abandonam, os que maltratam, é isto que sinto como cuidadora. Que leis existem em prol de quem não tem autonomia para se cuidar, para que foi criado um complemento para uma terceira pessoa? Porque será que nos centros de saúde, nas clinicas, nos hospitais não existem pessoas especializadas para lidarem e tratarem pessoas com necessidades especiais? Será preciso especificar o que são pessoas com necessidades especiais? Penso que não.
Falando do meu caso, sou tutora da minha mãe, ou seja, de alguém com anomalia psíquica, o que quer dizer isto aos funcionários públicos e não públicos, será que sabem o que isto quer dizer? Talvez se eu dissesse que era geriatra fosse mais bem tratada, mas como só sou cuidadora e filha tratam-me como uma abstração, como alguém que nem conhece bem quem trata, isto para não dizer, e a ela tratam-na como se fosse autónoma, achando que a conhecem melhor do que eu que estou vinte e quatro horas sobre vinte quatro horas desde que sofreu os três AVC`s, uma meningite, uma icterícia, tudo isto no período de quatro dolorosos meses hospitalizada, mesmo estando hospitalizada aquando os internamentos estive lá durante o dia todo, só não dormia no hospital porque não o permitiam.
Isto não se trata de choradinho e muito menos que tenham compaixão ou pena, mas sim para exigir respeito, mais respeito pelo cuidador, não sou objecto voador não identificado, nem um pano usado que se calca ou se pisa só porque o senhor doutor(a) tem um diploma que assim o classifica, ou um técnico que tira fotografias a um osso, (porque agora se chama técnico a qualquer um), pensam que conhecem o paciente melhor do que eu. Isto tudo para dizer que não existe respeito nenhum pelos cuidadores nem pelos idosos e aqui não incluo idosos capazes ou incapazes, mas sim pessoas.
Neste longo processo e pelo que vejo, continuo a achar, os velhos são um alvo abater, um peso pesado nos cofres do estado e fardo na vida de muitos. Os cuidadores não passam de uns inúteis inactivos que gostam de viver ao alto, foda-se o sistema.

Conceição Bernardino



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