Dentro de um casulo de cravos plantados à beira-mar

Data 20/11/2016 22:26:54 | Tópico: Poemas



amor, esse mar de escombros, que carrego dentro de tantos corpos, fluem de um copo vazio, onde o vício se transforma num ruído de papel, encravado na fita seca da máquina de escrever, que o penhorista me levou para pagar a última garrafa de vodka. A música repete-se “La Bohème”, e no alto da escadaria perdem-se degraus, os corpos nus já não se passeiam, mas a fome contínua dispersa pela sala, pelas ruas e os corpos continuam a tombar dentro de mim. Dentro de um casulo de cravos plantados à beira-mar. Descanso agora no agasalho dos meus antepassados, mortos por uma tosse convulsa ou pela febre compulsiva dos fascistas. Agora que ceguei ainda consigo fotografar os punhos erguidos do Zeca gritarem; “Vão dizendo em toda a parte o pintor morreu”.
A tinta continua a sangrar em pequenos pincéis, sei que uma dessas gotas será minha até ao fim…

Conceição Bernardino



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