Construção verborrágica, uma sátira em prosa

Data 02/06/2017 11:17:18 | Tópico: Prosas Poéticas

As palavras fogem. Assim como os pensamentos, elas vagueiam no vento como fumaça escura. Volta e meia, tomam forma. Volta. E meia. Certa vez, vislumbrei uma alface na fumaça contra a luz. Na fumaça do cigarro contra a luz. Na fumaça do cigarro contra a luz da televisão. Era uma folha de alface tão bonita. Sabia que existem mais de sete tipos de alface cultivados no Brasil? Algumas delas nem são verdes. Me disseram uma vez. Eu sei que só conheço um. Nunca gostei de alface. Não tem gosto de nada. Uma senhora que vendia verduras na feira de domingo uma vez me disse: "Tudo o que é verde é bom!". Eu, que tinha uma parede verde na minha sala. Que seria pintada naquele dia. Não sei porque. Só queria mudar a cor. Talvez pintar de branco. Mas eu nem gosto de branco. Prefiro preto. Sabia que preto não é cor? É ausência. O quê? Ausência. De cor. Enfim, naquele dia eu acabei economizando o dinheiro da pintura na parede. Essas tintas são caras sabia? Acabei comprando um monte de verdura. Fiz uma salada com todas elas. E a comi sentado na minha poltrona de couro preta. Com manteiga. De frente para a parede verde. Tava aqui pensando. Nessa coisa de ausência, sabe. É curioso como a falta define algumas certezas. Você só percebe que não precisa mais de papel higiênico quando ele acaba, por exemplo. A propósito, quando foi que substituíram os bidês pelos chuveirinhos? Eu entendo as palavras. Essa coisa da fuga e tudo mais. Embora não saiba usá-las de maneira adequada. Eu as entendo. É como se nós precisássemos de um pouco de aleatoriedade para criar alguma forma. E algum sentido de vez em quando. Ta aí uma analogia interessante.


Este texto vem de Luso-Poemas
https://www.luso-poemas.net

Pode visualizá-lo seguindo este link:
https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=324290