Os filhos incógnitos

Data 12/04/2018 20:56:59 | Tópico: Textos




Não me deixei cair na mesquinhez de lamentações fúteis, os meus olhos negros escondiam uma menina órfã que rapidamente moldou uns belos seios de mulher, desejei-os antes de os entregar à ira da mediocridade dos ladinos. Quis ser a primeira a tocar-lhes; sem pudor despir-me em frente ao espelho, (única peça que adornava o meu quarto), suavemente deslizei os dedos sobre os mamilos adornados de seda, endurecidos de deleite que pediam que me penetrasse, e, num vaivém de uma dança mística amei o meu corpo pela primeira vez, brindei-me com um cocktail de sabores delirantes.
Finalmente tinha-me encontrado com o meu corpo, ergui-o da vegetação, da pena incondicional a que o entregara com nojo de ser mulher. O mundo da “Besta” incompleta que me paralisara tinha fenecido, no momento em que pari a própria vontade de me parir; jurei não rezar mais hóstias bolorentas nem jejuar a fome da impunidade de um cão que se ajoelhava na missa à caça de mais um petiz para o seu cardápio. Voltei pela última vez ao adro da igreja, precisava de o olhar, (no olho que ainda lhe restava), no preciso instante tive a certeza que o seu sadismo não coligia rostos, havia de o matar da mesma forma que ele matou a criança no túmulo do meu corpo.



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