Conversas para boi acordar

Data 10/08/2021 03:04:14 | Tópico: Crónicas

Recordo-me do tempo que quando eu vinha para escrever meus textos trazia blocos de papel pautado, sem margem, daqueles que a abertura da capa de dava para cima e a dobrávamos para trás.
Não podia faltar meu tinteiro, pouco importava a marca, menos aqueles chineses, pois não tinha a cor azul turquesa. Eu sempre escrevi com a minha caneta tinteiro favorita (uma Montblanc) e a tinta de cor azul turquesa. Desde a escola eu olhava de longe e identificava aquele azul cheio de vida. As provas corrigidas que o professor punha sobre sua mesa vinham na ordem da maior nota para a menor, e assim, eu sabia se tirara boa nota quando via traços azul turquesa logo em cima da pilha de provas.
No começo uma professora de francês queria implicar comigo: Jeune Dizioli, cette couleur de stylo ne peut! Meu pai era um homem culto e elegante, ele me dera a Montblanc, assim minha mãe o mandou na escola falar com o diretor e a francesa... "Não pode o caralho... a tinta obrigatória das canetas não é o azul? Que porra de cor é essa? Ah é azul? Então, com licença, vamos filho... Madame Manon Moreau (MMM) quase teve uma síncope, suas bochechas ficaram tão vermelhas que parecia que iam sangrar. Ela nunca mais falou da cor da tinta da minha caneta. Bem, mas ai chegou o "pescoço" que eu esperava com ansiedade... "Le cou" deveria ter dito eu... Acho que 'sem querer' eu possa ter dito "Le cul".
Ok, ok, fui expulso da classe de francês... e daí? Passei para turma de inglês (britânico) e Mr. Hammersmith nos apresentou a Sympathy for the Devil: "...Pleased to meet you/Hope you guess my name..." Eu descobri uma parte de mim ao descobrir os Rolling Stones... não que eu goste deles. Mas foi da música, do ritmo irreverente, aquilo era apenas rock'n'roll... but I liked: "If I could stick my pen in my heart...", voltaram a dizer os Stones... Mr. Hammersmith no final de uma aula me disse Mr. Sergius se você quiser ir para Los Angeles, inscreva-se e ganhe o concurso do American Fields...
Sim era isso... para aprender outra língua eu tinha que saber bem a minha... "espetar a caneta no coração" - disse Jagger... isso era sinônimo de ser poeta. Só os poetas podem abastecer sua pena diretamente no coração. Eu seria um poeta! Ali nasceu Mr. Sergius, ali nasceu o poeta em mim. Antes de viajar, não me permiti esquecer de colocar dois blocos de papel pautado na mala, dois tinteiros azul turquesa e a minha inseparável Montblanc Meisterstück Black Gold LeGrand. Los Angeles não saia daí que eu estou indo!


Este texto vem de Luso-Poemas
https://www.luso-poemas.net

Pode visualizá-lo seguindo este link:
https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=358418