
Análise do poema A Lareira da Infância do poeta Ricardo Maria Louro
Data 21/08/2025 10:21:53 | Tópico: Poemas
| Análise do poema "A Lareira da Infância" de Ricardo Maria Louro. vamos ler o poema em trechos, para pensarmos melhor sobre os seus significados:
Trechos selecionados
1. Cena inicial da memória e do aconchego
> "Na casa do Outeiro, em Monsaraz, junto ao lume que se ateia... Era eu uma criança, jovem entre velhos, cheio d’alegria, Amor e Esperança! Tanto calor que me vinha da lareira da Infância!"
2. A saudade e o diálogo familiar
> A Tia Josefa pergunta ao Avô: “que fizeste tu da alegria...?”
O Avô responde: “Estou velho minha irmã... Mas como as bagas da Romã, a memória fica junto ao Coração... imersa, arreigada, numa imensa solidão!”
A Tia Josefa suspira: “Fica a saudade... Nossa mãe, nosso pai, já estão na Eternidade...”
3. O conselho da Avó e a missão do poeta
> A Avó, silenciosa, diz: “Ouve, meu Neto, um dia, nenhum de nós aqui estará! E a tua glória, será escrever em verso aquilo que nos ouviste… Mas escreve com Esperança, não te esqueças!”
4. Fecho emocional e consciente do tempo
> “Em volta da lareira os três sorriam… minha infância, momento terno, era quente, com a Esperança… Mas a Morte sempre vem! É breve! E tudo leva! Fica a memória na saudade e a saudade nos meus versos! É esta minha única Glória!!!!”
Análise e interpretação
1. Memória e identidade afetiva
O ambiente da infância — junto à lareira em Monsaraz — representa um espaço emocional seguro e afetivo. A “lareira da Infância” é símbolo de calor, proteção e pertença. A presença dos avós e da tia sugere raízes familiares e tradições transmitidas oralmente, enquanto o cheiro e o lume evocam sentidos e lembranças concretas.
2. Tempo, saudade e melancolia
Os diálogos revelam que o tempo é inexorável: o avô está envelhecido, os pais já faleceram, a saudade permanece. A metáfora das “bagas da Romã” simboliza memórias que permanecem férteis, vivas no coração e na solidão do envelhecimento. A saudade, aqui, não é apenas nostalgia, mas condição permanente da existência — um patrimônio emocional e espiritual.
3. Poesia como missão e esperança
A voz da avó confere ao eu lírico uma missão: transformar essas memórias em versos, lembrando que a escrita deve manter a esperança, mesmo diante da mortalidade. Aqui vemos o poeta como guardião do passado, alguém que dá voz à memória familiar e emocional.
Ricardo Maria Louro, na sua obra em geral, caracteriza-se por uma poesia profundamente autobiográfica, marcada por saudade, espiritualidade e memória regional — o Alentejo, Monsaraz, a fé e o fado como referências afetivas e litúrgicas .
4. Confronto com a mortalidade
O poema não idealiza a infância como utopia estática. Ele reconhece a finitude da vida — “Mas a Morte sempre vem! É breve! E tudo leva!” —, mas resgata no agir poético uma forma de transcendência. A glória do poeta está em usar a escrita para preservar e aquecer esse lume emocional, perpetuando a memória.
5. Estilo: lirismo confessional e imagético
O texto de Louro utiliza metáforas sensoriais — lareira, calor, bagas, memória como fruto e coração. O discurso é direto e emocional, com forte musicalidade — lembrando o fado — e ritmo oral. Isso é coerente com a análise da sua obra, onde imagens poéticas e ritmo popular se mesclam à devoção e confissão pessoal .
Conclusão
O poema "A Lareira da Infância" é uma poderosa evocação da infância, da memória familiar e da saudade, com a lareira como metáfora central desse fervor emocional. Por meio do diálogo com os entes queridos, confronta-se a passagem do tempo e a inevitabilidade da morte, mas também reafirma-se a possibilidade da poesia como gesto de esperança e de preservação da alma.
A Lareira da Infância:
(EU)
Na casa do Outeiro, em Monsaraz, junto ao lume que se ateia, sentavam-se à conversa, à hora da ceia, meu Avô, minha Avó e a Tia Josefa! Era eu uma criança, jovem entre velhos, cheio d'alegria, Amor e Esperança! Tanto calor que me vinha da lareira da Infância! Um leve odor ... E a Tia Josefa, branca, imponente, lânguida, serena, sisuda, começava a conversa!
(PARA MEU AVÔ)
Ó meu irmão, que fizeste tu da alegria que pela Vida fora te conhecia?! Às cores do teu rosto que o Sol ardente te havia posto?! Essa expressão, risonha e calma, que me alembro, a força do teu corpo, a Vida da tua Alma!!! Onde, meu irmão?! Onde?! ...
(EU)
E estoira a lenha na lareira da Infância! Meu Avô, atento, ouve a conversa, e responde, fixando a Tia Josefa!
(MEU AVÔ)
Estou velho minha irmã! O tempo passa ... Mas como as bagas da Romã, a memória fica junto ao Coração, imersa, arreigada, numa imensa solidão! E ái do Coração! Ái do Coração!
(TIA JOSEFA)
É Verdade meu irmão! É Verdade ... Fica a saudade... Nossa mãe, nosso pai, já estão na Eternidade ...
(EU)
E a lareira da infância ardia, queimava a lenha da saudade ... Era lá que em criança minha Alma se aquecia! E minha Avó, silenciosa que estava, ouvia! Profunda, graciosa, sentia Esperança, junto à lareira da infância! E dizia:
(MINHA AVÓ)
Ouve, meu Neto, um dia, nenhum de nós aqui estará! E a tua glória, será escrever em verso, aquilo que nos ouviste, junto à lareira da infância! Mas escreve com Esperança, não te esqueças! E triste, ou não, guarda sempre na lembrança, a conversa da lareira, que ouviste à hora da ceia, à beira de teu Avô, tua Avó e da Tia Josefa!
(EU)
Em volta da lareira os três sorriam, e minha infância, momento terno, era quente, com a Esperança, de quem sente, que aquele instante podia ser Eterno! ... Mas a Morte sempre vem! ... É breve! E tudo leva! Fica a memória na saudade e a saudade nos meus versos! É esta minha unica Glória!!!!
Ricardo Maria Louro Na Casa do Outeiro em Monsaraz Junto à Lareira da Infância
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