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Análise do poema A Lareira da Infância do poeta Ricardo Maria Louro

 
Análise do poema "A Lareira da Infância" de Ricardo Maria Louro. vamos ler o poema em trechos, para pensarmos melhor sobre os seus significados:

Trechos selecionados

1. Cena inicial da memória e do aconchego


> "Na casa do Outeiro, em Monsaraz, junto ao lume que se ateia... Era eu uma criança, jovem entre velhos, cheio d’alegria, Amor e Esperança! Tanto calor que me vinha da lareira da Infância!"

2. A saudade e o diálogo familiar

> A Tia Josefa pergunta ao Avô: “que fizeste tu da alegria...?”

O Avô responde: “Estou velho minha irmã... Mas como as bagas da Romã, a memória fica junto ao Coração... imersa, arreigada, numa imensa solidão!”

A Tia Josefa suspira: “Fica a saudade... Nossa mãe, nosso pai, já estão na Eternidade...”

3. O conselho da Avó e a missão do poeta

> A Avó, silenciosa, diz: “Ouve, meu Neto, um dia, nenhum de nós aqui estará! E a tua glória, será escrever em verso aquilo que nos ouviste… Mas escreve com Esperança, não te esqueças!”

4. Fecho emocional e consciente do tempo

> “Em volta da lareira os três sorriam… minha infância, momento terno, era quente, com a Esperança… Mas a Morte sempre vem! É breve! E tudo leva! Fica a memória na saudade e a saudade nos meus versos! É esta minha única Glória!!!!”

Análise e interpretação

1. Memória e identidade afetiva

O ambiente da infância — junto à lareira em Monsaraz — representa um espaço emocional seguro e afetivo. A “lareira da Infância” é símbolo de calor, proteção e pertença. A presença dos avós e da tia sugere raízes familiares e tradições transmitidas oralmente, enquanto o cheiro e o lume evocam sentidos e lembranças concretas.

2. Tempo, saudade e melancolia

Os diálogos revelam que o tempo é inexorável: o avô está envelhecido, os pais já faleceram, a saudade permanece. A metáfora das “bagas da Romã” simboliza memórias que permanecem férteis, vivas no coração e na solidão do envelhecimento. A saudade, aqui, não é apenas nostalgia, mas condição permanente da existência — um patrimônio emocional e espiritual.

3. Poesia como missão e esperança

A voz da avó confere ao eu lírico uma missão: transformar essas memórias em versos, lembrando que a escrita deve manter a esperança, mesmo diante da mortalidade. Aqui vemos o poeta como guardião do passado, alguém que dá voz à memória familiar e emocional.

Ricardo Maria Louro, na sua obra em geral, caracteriza-se por uma poesia profundamente autobiográfica, marcada por saudade, espiritualidade e memória regional — o Alentejo, Monsaraz, a fé e o fado como referências afetivas e litúrgicas .

4. Confronto com a mortalidade

O poema não idealiza a infância como utopia estática. Ele reconhece a finitude da vida — “Mas a Morte sempre vem! É breve! E tudo leva!” —, mas resgata no agir poético uma forma de transcendência. A glória do poeta está em usar a escrita para preservar e aquecer esse lume emocional, perpetuando a memória.

5. Estilo: lirismo confessional e imagético

O texto de Louro utiliza metáforas sensoriais — lareira, calor, bagas, memória como fruto e coração. O discurso é direto e emocional, com forte musicalidade — lembrando o fado — e ritmo oral. Isso é coerente com a análise da sua obra, onde imagens poéticas e ritmo popular se mesclam à devoção e confissão pessoal .

Conclusão

O poema "A Lareira da Infância" é uma poderosa evocação da infância, da memória familiar e da saudade, com a lareira como metáfora central desse fervor emocional. Por meio do diálogo com os entes queridos, confronta-se a passagem do tempo e a inevitabilidade da morte, mas também reafirma-se a possibilidade da poesia como gesto de esperança e de preservação da alma.


A Lareira da Infância:

(EU)

Na casa do Outeiro, em Monsaraz,
junto ao lume que se ateia,
sentavam-se à conversa,
à hora da ceia,
meu Avô, minha Avó
e a Tia Josefa!
Era eu uma criança,
jovem entre velhos,
cheio d'alegria, Amor e Esperança!
Tanto calor que me vinha
da lareira da Infância!
Um leve odor ...
E a Tia Josefa, branca,
imponente, lânguida, serena,
sisuda, começava a conversa!

(PARA MEU AVÔ)

Ó meu irmão, que fizeste tu
da alegria que pela Vida fora
te conhecia?!
Às cores do teu rosto
que o Sol ardente te havia posto?!
Essa expressão, risonha e calma,
que me alembro, a força do teu corpo,
a Vida da tua Alma!!!
Onde, meu irmão?! Onde?! ...

(EU)

E estoira a lenha na lareira da Infância!
Meu Avô, atento, ouve a conversa,
e responde, fixando a Tia Josefa!

(MEU AVÔ)

Estou velho minha irmã!
O tempo passa ...
Mas como as bagas da Romã,
a memória fica junto ao Coração,
imersa, arreigada,
numa imensa solidão!
E ái do Coração! Ái do Coração!

(TIA JOSEFA)

É Verdade meu irmão! É Verdade ...
Fica a saudade... Nossa mãe, nosso pai,
já estão na Eternidade ...

(EU)

E a lareira da infância ardia,
queimava a lenha da saudade ...
Era lá que em criança
minha Alma se aquecia!
E minha Avó,
silenciosa que estava, ouvia!
Profunda, graciosa, sentia Esperança,
junto à lareira da infância! E dizia:

(MINHA AVÓ)

Ouve, meu Neto, um dia,
nenhum de nós aqui estará!
E a tua glória, será escrever em verso,
aquilo que nos ouviste,
junto à lareira da infância!
Mas escreve com Esperança, não te esqueças!
E triste, ou não, guarda sempre na lembrança,
a conversa da lareira, que ouviste
à hora da ceia, à beira de teu Avô, tua Avó
e da Tia Josefa!

(EU)

Em volta da lareira os três sorriam,
e minha infância, momento terno, era quente, com a Esperança, de quem sente,
que aquele instante podia ser Eterno! ...
Mas a Morte sempre vem! ...
É breve! E tudo leva!
Fica a memória na saudade
e a saudade nos meus versos!
É esta minha unica Glória!!!!

Ricardo Maria Louro
Na Casa do Outeiro em Monsaraz
Junto à Lareira da Infância




Ricardo Maria Louro

 
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Ricky
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