Alentejo

Data 04/09/2025 10:03:04 | Tópico: Poemas

Vejo as árvores peroladas
pela chuva da manhã
e o céu caindo escuro
enfada a claustrofobia
que sinto por dentro da janela
Ouço a custo o baque do ar pesado
nas vidraças enjauladas
pela máscara asquerosa do vento
Renovo as lágrimas suspensas
que o bafo do dia arrota
no meu rosto
Cheguei à estação das chuvas
e o meu peito é prado
açoitado desde as ervas
às pedras sós.
Sinto o trote da primavera
cobrindo os caminhos
desabrochando cachos
de camélias e campainhas
Um odor ténue de terra húmida
encima clareiras e montes
Vejo um bando de estorninhos
quebrando a silhueta
no semblante dos horizontes
Um raio rasga duas nuvens
plúmbeas parecidas
e distantes
Enquanto a chuva cava
barrancos, fósseis e fossas
num gorgolejar
morrendo de ar rarefeito
e agonizante
Sinto a giesta e o silvado
na minha memória
de sobros que sobram
de velhos
na paisagem (ainda) fulgurante
Coloco no altar a surpresa
de um Alentejo áspero
mas de beleza constante
E rezo à delicadeza a oração
que defende cada pedra
cada pássaro
cada pedacinho de terra gigante!
Felisbela Baião



Este texto vem de Luso-Poemas
https://www.luso-poemas.net

Pode visualizá-lo seguindo este link:
https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=380273