
Do céu aberto
Data 30/09/2025 12:12:21 | Tópico: Poemas
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desconheço a porta por onde entraste mas é quase certo que tem as dobradiças bem oleadas e fechadura sensível com língua de seda deve ser de madeira muito bem tratada com todas as brechas calafetadas e rematada com verniz desprovido de estalos
eu que pensava que todas as portas rangiam ao mínimo aproximar e qualquer toque nas maçanetas causava prurido e que ao primeiro rufar de campainha elas engrossavam num peso bruto de daqui não passas
dessa porta não se ouviu voz a soletrar nome às frinchas do aro não soprou aragem de respirar do lado de fora pela soleira nem passou perfume em sinais de criar químicas tão pouco voaram cartas de amor pela caixa de correio agulha
o soalho à entrada não gemeu nem o tapete personificado escorregou de estatelar nem os candeeiros te caíram que nem brincos de cristal a tilintar às minhas orelhas muito menos soaram alarmes nos sensores de abafar os olhos
todas as portas ficaram caladas até à cozinha onde a chaleira te foi às mãos com poemas chá de hipericão e o armário afastou-se da ficção para te caírem bolachas húngaras recheadas com mel de abelha mestra de achegar-se
não bastasse, todas as portas te prestaram vassalagem até à sala de estar e a lareira subiu de chamas até à boca a dizer eufemismos impróprios para cardíacos até beijar com as letras todas do eucedário
que porta é essa, por onde entraste que apagou todas as paredes da casa até um quarto a céu aberto?
30-09-2025
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