
Palavras Mortas
Data 04/12/2025 07:51:33 | Tópico: Poemas
| Vivemos no império das telas, onde a alma é pixel e o toque — ilusão. Os sorrisos são filtros que mentem, e o amor... virou legenda de ocasião.
As praças foram substituídas por stories, os abraços, por emojis apressados, e até a dor perdeu a sua estética, diluída em frases prontas, recicladas.
Ninguém mais lê os poetas mortos, ninguém mais morre de amor. Hoje morre-se de tédio, de ansiedade, de curtidas que não vieram a tempo.
A poesia — essa velha mendiga de luz — pede esmolas na calçada digital. Os escritores, cansados e vaidosos, vestem-se de marketing sentimental.
Publicam versos como quem vende perfume, em vitrines de likes e algoritmos. Confundem profundidade com pose, e a alma... com um bom engajamento.
A mídia, essa nova deusa narcísica, dita quem merece ser lembrado, apaga os que ainda sangram de verdade, porque sangue real não gera anúncio.
As vozes dissonantes foram caladas, trocadas por slogans e sorrisos pagos. A arte virou mercadoria, e o pensamento — um produto descartável.
Já não há tempo para o espanto, nem espaço para o silêncio. A pressa virou virtude, e a reflexão, um defeito de fábrica.
Vivemos conectados — e sozinhos. Milhares de amigos, nenhum confidente. Milhares de corpos, nenhum olhar. Milhares de frases, nenhum sentido.
Os poetas se tornaram influenciadores, as dores, conteúdo. O amor, performance. E a alma... uma hashtag.
Mas o mundo continua vazio, e ninguém percebe o buraco no peito. Preferem a anestesia do brilho, ao abismo verdadeiro do encontro.
As ruas estão cheias de corpos cansados, corações em modo avião, e olhos que não se cruzam mais, com medo de se reconhecerem.
Tudo parece uma Matrix sem cor, onde os sonhos foram trocados por metas, e a vida — por uma rotina programada. A liberdade? Só mais um dado no sistema.
E nós, poetas, resistimos entre as ruínas, gritando versos que ninguém escuta, como quem fala com fantasmas famintos.
Mas ainda escrevo, porque recusar o silêncio é um ato político. Porque amar em tempos de desumanização é a maior forma de rebeldia.
E quando tudo for só ruído e propaganda, quando a poesia for lembrada como um erro, eu deixarei minha palavra aqui — para ferir o tempo e acordar o esquecimento.
Pois enquanto houver um poeta que sangra, haverá esperança de que a humanidade retorne.
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