pessegueiros em flor

Data 01/06/2008 15:28:59 | Tópico: Poemas

desço devagar as amplas escadas
a pedra branca
a madrugada flutuante em respingo inolvidável.

o jardim
dos pessegueiros em flor, dos gomos pontiagudos
dos seios de uma mulher infanta
e os sub-reinos
d’amplexos ausentes
e os bichos
a ratar antes do tempo tomo rebento.

desço dengosa
tropeço nas memórias de outras eras
de outros ventos
acessos estão os dedos a rebolar nos pulsos
na viagem para além de mim, menina outra,
(a que não vi, que não conheço, a que me lembro, a que esqueci… talvez) volta

na náusea e na revolta
no lixo de si
sentir.

as tranças grossas a beijar o sopé das coxas
e os laços rosa de cetim
e o mar… o mar e o céu em tenro olhar
varrido
e o cristal do corpo
fragmentado

o rio ao lado
o rio ali
o rio em si
em tenacidade, morria.

o rio leva a fúria das águas
os olhos ganham duros contornos onde
nem os peixes mais lestos saberiam nadar
de tão funestos.

desço a escada
sobe a água
abrem-se as comportas
na brutalidade das mãos
a arrebatar os pomos juvenis de uma mulher
criança ainda.

o filme corre. chega ao fim. o cinematógrafo está vazio. só eu vi?...


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