Entrelacei o verbo e o ventoso vento

Data 22/05/2007 22:24:45 | Tópico: Poemas -> Sombrios

Entrelacei o verbo e o ventoso vento
e da brida brisa construí líquida barragem.
Arquitectei um barco em forma de guindaste
com pernas de gelo.
No anelo e no enlevo, ambicionei pô-lo a navegar
nos trópicos incandescente do teu olhar
tristonho. Era o meu sonho.
Incauta, não percebi que o meu destino
se passou destilado
num anguloso trilho
de um comboio perpetuamente descarrilado.

(E o rio aqui ao lado….)

Então,
no céu, em ardósia d’astro, na exactidão,
o meu destino no teu, entrelaçado,
gemeu frio e fino. No teu, cruzado,
tal linha epigrafada em granito peregrino,
na forma de rio absurdo, caldo e mudo.
Na evidência, na certeza elementar
d'alma aglutinada, continuamente a chorar
a luz exacta e branda
da simplicidade original
da água caldeada, desprovida de cheiro e sal
no fogo solto de um emudecido lamento.

Cruzei o verbo e o ventoso vento
e da brida brisa vertical compus líquida barragem.
Gaivota ferida, procurei a vaga
nas margens aporticadas dos teus ombros.
Acordei adormecida em auroras de pedras desmaidas.

Não mais sonho
Não mais brida
Nem Soís de riso

Tudo se perde, tudo emudece, tudo escurece
no Sol gentio que, na linha d'água,
imperfeito, impreciso, sem norma ou regra,
se afoga, tomba e quebra.

No horizonte, os muros e os membros.
No horizonte o vento. Dorme mais fundo.
No horizonte, eu e o meu silenciado mundo!



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