" Coragem o inverso da fraqueza? " Nuances - o genial escritor e poeta Stefan Zweig
sem nome


Acabei de ler a biografia de Maria Antonieta, escrita pelo genial Stefan Zweig ( todos os livros que li deste autor me emocionaram e tocaram a alma, profundamente) Escritor famoso – tradutor, biografo, novelista, poeta, romancista, dramaturgo, etc... – foi amigo e contemporâneo de Freud , Hesse, Rilke, Thomas e Karl Mann,J. Joyce, Jules Romains, Verhaeren, A. Toscanini, W, Benjamin e muitos outros “gênios“ do século passado. Homem e artista universal, prezava a amizade e traduzia / divulgava as obras dos escritores e poetas que admirava para serem conhecidos na cultura alemã. Também era um propagandista da paz (depois da primeira guerra), lutava por uma humanidade melhor... buscava a paz , também, para sua alma atormentada.

Mas, seu destino estava escrito e seria trágico como o de alguns (biografados ou mesmo personagens) nos seus escritos maravilhosos – “A luta contra o demônio” (Kleist, Hölderlin, Nietzsche), “ Maria Antonieta”, “Maria Stuart” e outros tantos...

Quando Hitler assumiu o poder, ele, judeu austríaco (como Freud e outros intelectuais contemporâneos, judeus ou não), precisou fugir para não morrer... tornou-se um "judeu alemão errante", como dizia... isso, (estas circunstâncias ) determinou seu drama e sua tragédia. Era um herói em todos os sentidos (socorro moral, material, fraternal) e, como todo herói, o final trágico o buscou...


No último cartão de felicitações, pelo Ano-Novo de 1941, para os amigos que viviam exilados nos EUA, ele envia uma estrofe dos Lusíadas traduzida em alemão, a língua materna dos companheiros refugiados. Estava deprimido e tinha decidido, há tempos , acabar com a própria vida... era um gestor da Amizade e inimigo da violência – o terror da época o transtornava, por isso a decisão final - “ a morte que se escolhe é sempre mais bela” (Montaigne) - afirmação à liberdade individual, que Zweig acreditava...


“No mar, tanta tormenta e tanto dano,
Tantas vezes a morte apercebida;
Na terra , tanta guerra, tanto engano,
Tanta necessidade avorrecida!
Onde pode acolher-se um fraco humano,
Onde terá segura a curta vida,
Que não se arme e se indigne o Céu sereno
Contra um bicho da terra tão pequeno? “


(oitava n°106 do Canto primeiro)




“[i]O sábio vive quanto deve, não quanto pode[/i]” , dizia Montaigne.

... e, Zweig concordava com esta afirmação. Ele não mais acreditava num futuro, sofria no exílio - sofria por sua amada Áustria perdida e anexada à Alemanha, sofria por sua cultura dilacerada . O pior sofrimento era como emigrante (e escritor), errante no mundo; e, neste exílio, ter de perder sua língua (alemão , língua negada e amaldiçoada naqueles tempos), obrigada a ser substituída por outras (inglês, francês, espanhol, russo, português , etc). Abandonar aquela língua/idioma em que viveu, pensou e sonhou sua vida toda, era, já, uma morte. E, mesmo vivendo na América, últimos tempos no Brasil (Petrópolis), longe dos conflitos, ele sabia que pertencia ao Velho Mundo,o qual acreditava estar em agonia, morrendo... morreria com ele.


Numa última conferência em Nova York (maio de 1941) ele dá adeus ao mundo. Emocionado, pede perdão à todos os povos afetados pela guerra de Hitler , pela “ hora sombria” onde o “ espírito alemão transfigurado” cometia tantas atrocidades contra a humanidade. Entretanto, ele era uma vitima também, da época, das circunstâncias; mas, grande “humanista”, sentia-se culpado. Nunca renegou sua pátria, sua língua e sua cultura, podia deixar seu país, mas não podia deixar ou negar suas raízes...


A coragem não é senão o inverso da fraqueza! “ – palavras escritas em uma de suas novelas...


Estava fraco e derrotado moralmente, vencido pelos tormentos da sua época que o possuíam, seus demônios interiores o subjugam, gritando: loucura ou morte!


Escolhe a última (diferente de Nietzsche) , em 23 fevereiro de 1942, escapa deste terror, vai buscar a paz na outra dimensão, nos domínios do Hades. Num pacto suicida, ingere um veneno mortal com sua mulher Lotte... agora , só verá seus amigos no além...


Desesperado, mas lúcido , deixa varias cartas de despedida; uma delas agradecendo a hospitalidade brasileira:


“Antes de abandonar a vida por vontade própria e em plena lucidez, sinto necessidade de cumprir um último dever: agradecer profundamente ao Brasil, este maravilhoso país que me proporcionou, assim como ao meu trabalho, um descanso tão amigável e tão hospitaleiro.Um dia após o outro aprendi a amá-lo mais e mais e em nenhuma outra parte eu teria preferido construir uma nova existência, agora que o mundo da minha língua materna desapareceu para mim e que a minha pátria espiritual, a Europa, destruiu a si própria.

Mas, com mais de sessenta anos seria necessário ter forças extraordinárias para recomeçar totalmente a vida. E as minhas esgotaram-se devido aos longos anos de errância. Além disso, creio que vale mais por um fim a tempo, e de cabeça erguida, a uma existência no qual o trabalho intelectual sempre foi a alegria mais pura e a liberdade individual, o bem supremo deste mundo.

Saúdo todos os meus amigos. Que eles possam ver ainda a aurora após a longa noite! Eu sou por demais impaciente, parto antes deles ”.



Sua verve forte e melancólica não o abandona até seu final. "Coragem inverso da fraqueza?"... só a História saberia nos responder. O roteiro das vidas e das sociedades (civilizações), é sempre ela que dita e escreve...



Zweig, escreveu um ultimo poema em novembro de 1941, quando completou 60 anos.


Último poema

Suave as horas bailam sobre
O cabelo branco e raro.
A áurea taça a borra cobre:
Sorvida, eis o fundo, claro!

Pressentimento da morte
Não turba, é alívio profundo.
O gozo mais puro e forte
Da contemplação do mundo

Só o tem quem nada cobice,
Nem lamente o que não teve,
Quem já o partir na velhice
Sinta — um partir mais de leve.

O olhar despede mais chama
No instante da despedida.
E é na renúncia que se ama
Mais intensamente a vida.

(“Poemas Traduzidos”, 4ª edição, Livraria José Olympio Editora, 119 páginas)




Os livros de seus poemas são:

As cordas de prata” e “ Coroas precoces”


Mas há muitos outros poemas , dispersos, em suas magníficas obras.






ALICE LUCONI NASSIF

Criado em: 11/9/2013 16:17
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