o que há de errado com este poema?
Membro de honra
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28/9/2011 23:22
De Olinda, Pernambuco
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fiz esse poema agora há pouco,
mas algo nele me incomoda.
não sei se é a forma ou o conteúdo,
mas tem alguma coisa que está
me dando uma certa, digamos, agonia.



poeta maldito, eu?
(3/6/2012)

não tenho vocação
pra poeta maldito
ainda há precisão -
e mesmo bonito é -
de aceitar no pão
e aquiescer no café



alguém pode me ajudar?



caio

Criado em: 3/6/2012 23:16
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Re: o que há de errado com este poema?
Membro de honra
Membro desde:
31/3/2008 17:45
De Braga
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Para ter alguma lógica, o que nem sempre é original seria:

não tenho vocação
para poeta maldito
mas ainda há precisão
e mesmo bonito é -
roer o duro pão
e entornar café

Criado em: 3/6/2012 23:27
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Re: o que há de errado com este poema?
Membro de honra
Membro desde:
2/1/2011 21:31
De Lisboa (a bombordo do Rio Tejo)
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deixo-te outra leitura, ou agonia, Poeta


poeta maldito? Eu, que o seja,

e aquiescer no café,
de aceitar no pão, seja,

e mesmo bonito é - para poeta maldito,
vocação não tenho, seja a invocação que resiste,

ainda há precisão -

poeta maldito? Eu, que o seja.

Na minha opinião a palavra “aquiescer”, transforma o texto. Considero-a numa primeira leitura bastante forte, porque não colocá-la logo no principio? A composição é outra das leituras possíveis, que varia entre o ser e o não ser (universo Shakespeariano que seja) como se a dúvida persistisse para quem lê, não para quem escreveu, daí a repetição da palavra “seja” como interjeição “ De acordo, vá, faça-se “ como reforço do “poeta maldito”. Uma nota final, porque dar título ao texto e não fazer com que ele funcione como o ínicio do mesmo? Obrigado.

Abraço-te

("A Eternidade"

"De novo me invade.
Quem? – A Eternidade.
É o mar que se vai
Como o sol que cai.
...
Lá não há esperança
E não há futuro.
Ciência e paciência,
Suplício seguro.

De novo me invade.
Quem? – A Eternidade.
É o mar que se vai
Com o sol que cai."

lembrei-me de Arthur Rimbaud neste texto, onde ele repete o inicio do texto, no fim)

Criado em: 4/6/2012 5:13
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Re: o que há de errado com este poema?
Membro de honra
Membro desde:
31/3/2008 17:45
De Braga
Mensagens: 8095
Vim cá outra vez, rss
penso que o título diria uma nova leitura e tiraria a dúvida que agora vejo, mas o poema deixaria de ser um desafio

título

amargo/doce

Criado em: 4/6/2012 7:02
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Re: o que há de errado com este poema?
Membro de honra
Membro desde:
28/9/2011 23:22
De Olinda, Pernambuco
Mensagens: 898
passei rapidamente pra dizer umas duas coisas sobre o poema.
depois eu venho aqui com mais calma comentar as intervenções,
que gostei muito (principalmente a do Transversal, que me deixou de queixo caído).

a minha intenção no poema foi dizer que o eu-lírico não tem vocação para poeta maldito, porque ele gosta de seguir regras e rotinas, ou seja, aceita, aquiesce. tento falar da rotina ao usar as palavras pão e café.


foi isso


muito obrigado a vocês dois, Roque e Transversal,
e prometo que volto aqui pra falar.


um abraço em vocês!

Criado em: 4/6/2012 8:28
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Re: o que há de errado com este poema?
Membro de honra
Membro desde:
31/3/2008 17:45
De Braga
Mensagens: 8095
muito interessante este exercício que nos propuseste; gostei muito da tua explicação e também da do transversal.
não acertei mas não faz mal, talvez para a próxima
beijo

Criado em: 4/6/2012 8:54
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Re: o que há de errado com este poema?

Membro desde:
1/12/2011 19:30
De Rio de Janeiro
Mensagens: 533
Chamou-me atenção no teu poema, Caíto, a mistura de registros. Refiro-me, primeiramente, à palavra “precisão” que no poema em questão possui o significado de necessidade. Aliás, este, ao meu ver, é um registro oriundo da linguagem popular falada aqui no Brasil, especialmente na região nordeste. Ademais, não sei se foi tua intenção, o poema possui uma verve bem nordestina. Em segundo lugar, aparece o verbo “aquiescer”, palavra que costuma habitar um registro mais clássico e culto da língua portuguesa, daí a mistura de registros. Noto, aliás, que esta mistura de tons e registros, ou seja, a união, através do discurso poético, do português popular, brasileiro e nordestino com um registro da língua mais culto e normativo, é algo que você persegue nos teus poemas. Algo, por sinal, bastante difícil de fazer, mas que você tem conseguido realizar com algum êxito. Meu incentivo é o de que você continue a buscar isto. Penso que dessa mistura bem tropical de linguagens pode sair coisa muito boa. Grande abraço.

Criado em: 4/6/2012 20:10
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Re: o que há de errado com este poema?
Membro de honra
Membro desde:
2/1/2011 21:31
De Lisboa (a bombordo do Rio Tejo)
Mensagens: 3755
Voltei aqui quase incógnito, para te deixar mais alguma coisa, mas, sobre a marginalidade da poesia, poetas malditos no Brasil.

Aqui há uns tempos debrucei-me sobre essa realidade, poesia marginal, poetas marginais, e fiquei atónito (se é esta a palavra que posso escolher) com a riqueza do Brasil. A poesia marginal no Brasil é algo de festa, sarau, o poeta é o taxista, o rapper, o pobre, o que não é doutorado, apontadores do jogo do bicho, inclusivamente o poeta.

A poesia marginal no Brasil tem algo que, a nós europeus, pelo menos a mim, nos fascina por ser diferente, a musica, a arte, a dança, populares. Desde o bumba meu boi à capoeira, porque estamos a falar de urbanidade, sub-urbanidade, favela, comunidade, marginalidade,etc.

E é nesta riqueza Poeta por onde, em minha opinião deves iniciar a pesquisa, (uma outra agonia) aumentando o conhecimento sobre os poetas malditos, marginais. É óbvio, como diz o poeta Carlos Teixeira Luís que para se entender os poetas malditos é melhor ler na língua mãe, no caso de Rimbaud em françês, por causa da musicalidade das palavras, mas Caio, pelo Brasil encontras-los, com temas muito mais ligados a esta realidade que há europeia, e tenho a certeza de que irás gostar. Uma linguagem tão diferente, uma realidade diferente, algo de tão puro, duro, sofrido, e que passa ao largo das editoras (a poesia é assim mesmo, não dá lucro, só se for algum nome muitissimo conhecido).

Deixo-te aqui um vídeo de poesia maldita/marginal em todos os seus aspectos, uma celebração que, sem dúvida, eu adorei.
http://www.youtube.com/watch?v=7FyCf1CrFcI

Deixo-te também o link para um texto, “Literatura marginal”:os escritores da periferia entram em cena, de 2006, onde poderás ler mais sobre o assunto, e onde, a meu ver os pontos principais do poeta marginal no Brasil estão consignados, pelo menos históricamente:
http://www.edicoestoro.net/attachment ... %20ENTRAM%20EM%20CENA.pdf

São a meu ver momentos deliciosos, jamais agonias.

“Queria ser homem de terno
Deu teco a noite inteira
e ainda estava a fim.
No seu coração ribanceira,
uma pedra a rolar tim-tim por tim-tim;
Partiu pro trabalho
e nem sequer dormiu,
só se lembrava do brilho
na favela
do brilho reluzente daquele fuzil.
Desde cedo, mão-de-obra desqualificada,
tudo lhe desesperava.
Aquele salário raso,
que não dava pra nada,
no seu ódio se fez engasgo.
E se lembrava
da educação garapa
Que recebeu do Estado.
Tudo lhe ardia:
lâmina e faca.
Sacou da mochila,
do trabalho partiu.
Foi pro coração da favela
Pra São Jorge, sua mãe, acendeu uma vela.
No asfalto era o mau.
Atirou, roubou, matou, traficou.
Aos 15, seu conceito subiu.
Aos 17, fuzilado na favela,
na mala do Robocop saiu.
Distante agora
do mundo incolor,
achou o fundo do valão como cama,
e a lama o seu cobertor.”
(Edson Veóca, “Descaso, o cerol do gueto”, p. 14)



Obrigado.

Abraço-te


Criado em: 5/6/2012 3:41
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