Contos : 

A Raposa e as Uvas

 
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A raposa passeava e procurava alguma coisa para matar a fome, quando viu uma parreira de uvas maduras.
Eu nunca soube que raposa gostasse de uvas, mas sabe-se lá o que pensa uma raposa faminta...
Ela olhou para cima, pensou, analisou a situação e resolveu tentar: comeria as uvas!
Pensou que afinal, há tanta teoria nutricional hoje, tanta comida de passarinho para homens, tanta comida de homem para animais silvestres e comida expressa para quem tem pressa que não custava nada tentar.
Pensou também na dureza que seria, se tudo isso se passasse no tempo da sua avó: raposa sem recursos, que ficaria pulando e pulando para conseguir seu intento.
Pura divagação...
Passou a mão no celular 3G, e navegando pela internet, pesquisou a solução.
Hum...
E não é que entre soluções toscas, como a de um tal La Fontaine, inspirado por Esopo que pesquisou o assunto pelos idos de 1690, achou afinal algo que lhe valia!.
Sim, chamaria um moto-taxi!
Assim fez.
Depois de combinar o preço, pois sabia que hoje em dia, quem não combina antes, sai sempre no prejuízo, pediu que o dito cujo fosse ao circo “Vostoc” pedir préstimos à uma macaco prego, desses bem educados.
Educado hoje em dia, é coisa bem mais complexa... Educado é aquele que faz tudo que se manda, sem perguntar a razão.
Tipo útil, portanto, aos fins a que se propõe.
Chegando a moto com a encomenda, a raposa, rapidinho, explanou sobre o projeto.
Era simples a empreitada; subir no tronco de apoio da tal parreira em questão e escolher entre os mais bonitos, o cacho de uvas, fruto de tão simples pretensão.
E em poucos minutos, descia o macaco prego, com as uvas. Lindo cacho, saudável, e o melhor de tudo é que era, sem adição de agrotóxicos!
Pagou o serviço prestado e logo que ficou só, sentou-se sob a parreira, e confortável iniciou o experimento esperado.
Pegou uma uva, cheirou... Lambeu meio desconfiada e sem pôr fé no que via, mastigou e engoliu.
_ Nossa, que coisa horrível! Tem um gosto muito estranho...
Quando se deu por conta, tinha os pelos do lombo inteiramente arrepiados!
_ Mas isso é ruim demais! Impossível de se comer!
O que faria agora?
Pensou... Pensou...
Chamou de novo o mato-taxi. Novamente lá foi ele, buscar o macaco prego.
Quando o trouxe, a raposa, sem explicar senão mais nada, pulou em cima do bicho e o esganou numa piscada!
Dispensou o moto-taxi, cara sem preconceitos, e sob a sombra da parreira, se banqueteou a tripa forra.
E para não ser incomodado em tão gratificante manjar, até teve o cuidado de desligar o celular...

Moral da história: Desdenhar é apenas parte da problemática. Para se encher a barriga, é preciso a solucionática.
 
Autor
Paula Baggio
 
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Enviado por Tópico
HorrorisCausa
Publicado: 14/09/2008 20:41  Atualizado: 14/09/2008 20:41
Administrador
Usuário desde: 15/02/2007
Localidade: Porto
Mensagens: 3594
 Re: A Raposa e as Uvas
Esta fábula de elementos voláteis, permitem a Re-construção do espaço tradicional com traços de modernidade, sugere-nos personagens concebidas no nosso imaginário infantil, sem nunca esquecer que uma raposa será sempre uma raposa, mesmo que não lhe vista a pele.
Muito bem concebida esta fábula, assim como a ilustração...são de encher o corpo e alma.


Beijo

A ilustração

Enviado por Tópico
GlóriaSalles
Publicado: 15/09/2008 01:10  Atualizado: 15/09/2008 01:10
Colaborador
Usuário desde: 28/07/2008
Localidade: Flórida Pta-SP
Mensagens: 2514
 Re: A Raposa e as Uvas
Quanto conteúdo, quanta figura de linguagem...
A fragilidade com a qual escreve as fábulas é admirável.
És poeta, do fogo, do ar, da terra, do mar,da fauna, da flora, do dia, da noite, e de tantas coisas mais, resultando em uma poetisa exímia, e que passa verdades ´rrefutaveis em fabulas inteligentes como essa.
Sensibilidade intensa.
BJo Paula.
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