(invernias enigmáticas e desfolhadas)


já ao frio sou desfolhado
sob o manto da neve branca

tanta tanta tanta

e o meu voo enregelado
e o trinado está tolhido

se ao menos tivesse ninho
com quem repartisse carinho

quebraria este estigma
desvendar se ia o enigma

(longe vão os tempos
das searas)

Soubera eu
O segredo
Oculto na bainha
Do verso
Complexo
E seria
Exímia
A decifrar
O enigma
Que engrandece
O poema

Rasga se a árvore
Que sonha

E na folha nua
Vegeta o poema

Que adormecido
Espera mãos
Ardentes

Desaguando
Palavras
Em lugares
De acolhimento

Dos versos
Oníricos
Do poeta
Sonolento

Sedento...

Ouço rumores quem vêm da muralha
Mas eu confesso-me em desespero
Por não saber que a última mortalha
È de linho, ou pano cru em puro zelo

Há uma cancela semiaberta
Há um retoque na minha entrada
Há um acto que me desperta
Há a última relíquia ali encontrada

Tomara ver uma só janela
Que me abrisse à luz que é tua
E me vestisse dos trajes de outrora

Quisera ver uma imensa estrela
Que me quisesse tão nua e sua
Que me levasse no tempo, sem hora

(luares de inverno)


se adormeço
encontro o sonho
do outro lado
da cancela
se desperto
ardem me as mãos
que tentam agarrar
a minha estrela
mas são só nãos
essas relíquias
dançantes
e folhas nuas
são invernias
e caprichos
de sedutoras luas

[aqueça o pensar...]

Pensamentos
Idéias
hibernais
(re)gelam corações

Aqueça o pensar
com uma intuição
um desvelar
sem questões

São estas
astutas intenções
que controlam
mentes e emoções

As respostas
nada são
que reflexos
simples reações

Aqueça o pensar...

São solitárias
As penas
A que o poeta
Se condena
Quando
Na clausura
De si mesmo
É com firmeza
Que segura
Na sua pena
Feita fonte
Por onde
Ora vai bebendo
Na saudade
Ora é capaz de fazer
Jorrar
Sobre a alvura
Da folha
Lágrimas rubras
De infinitas tristezas
Que só ele sabe

inovadora crase
a gastar-se
sem dizer o motivo

pronuncia o que
outrem há-de escrever
simulando a caquéctica
rima mórbida

ímpia súplica
insignificante em
sepulcro sumptuoso


(nobre a consciência)

em ventos calmos
serenos, esvaindo-se
em quimeras
num campo de cereais
idolatrando as
quatro estações

(a súplica do ímpio)


não me mintas mais
nem me desmintas
nem me sopres ao ouvido
(estou todo dorido)
não me cantes versos
nem digas que sou teu
inimigo

não me consumas
fora dos tempos adversos

não me resumas
a uma rima negada
não me embriagues
numa paixão saudada
numa chama rubra
mas logo apagada

não me mortifiques
na esperança senil
(mesmo que a última a morrer)
não sabes já
que o fatigado coração
deixou de correr
e só ao passo da canção
se encosta ao peitoril
(para ver)
e se entretém a entretecer
imagens desfiadas
de um enigma febril
de uma musa gentil

não não me condenes
não me deixes mais
(aqui)
ficar assim a ti preso
sem motivo neste ledo
e instigador ardil

É preciso escutar
O silêncio
Saber ouvir
O que ele
Nos diz
No sussurro
De um leve
Sopro
D'alma...

Antes que o eco
Ensurdecedor
Do seu grito
Nos acabe
Por emudecer...