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Teclas de uma utopia

 
Um dia numa praia onde o silêncio amanhecia com os movimentos e os sons da natureza, os pássaros se calaram para a ver passar…e assim foi um começo na praia vazia por onde ela se despiu devagar numa leve descontracção, cada vez se sentia mais mulher e, mais ela, com aquele mar todo à sua frente, caminhava… deixando o rasto da sua roupa enquanto levava a mão aos seus cabelos negros, observando atentamente o mar. Na praia vazia, ela pressente o seu corpo como pássaro livre, por onde ela desliza os seus pés, maresia que fala mais próxima a cada momento. As pedras falam… os pássaros cantam suavemente…o céu converso com o mar respira tamanha natureza a cada passo, e o seu pensamento vai livre e cravado nas teclas de uma máquina de escrever antiga, como uma musa, passo ante passo… a cada passo que dá, cada tecla que bate na natureza de quem a descreve a cada passo. As ondas, essas, avançam devagar, tão devagar que deixam um raio de sol incidir sobre o seu corpo despido de preconceitos que se passeia em cada tecla. Tudo tão calmo que até se pode pressentir por detrás os passos de um criminoso que se levanta, coberto de lama e sensualidade, ou apenas os ramos das árvores que são sacudidos com o vento. O vento assobia nos cabelos despenteados, que se movimentam entre os pequenos grãos de areia que se soltam das pedras pequeninas que aguardam ser levadas pelo mar.
Por momentos os seus passos param, olhando o horizonte, no exacto momento em que a morte se aproxima dela, por alguns segundos pára de respirar, solta-se o seu corpo numa corrida travada, que a agarra por detrás, já caída no areal, até o mar oscilar num agarrar de mãos lavadas em argila. As pernas se tocam num sufocar de emoções, marcados na máquina, onde se repetem os vidros lascados sufocando por dentro do peito que se soltam em lágrimas caídas sobre uns seios bem desenhados, polidos e pequenos, enquanto os lábio sedentos seguem o tornear enlameado de duas inesquecíveis pernas, que se perdem no mais profundo oceano, vinham caminhando descalços sobre um rio chamado de Tejo.
Assim como num filme Francês nas conversas de uma vida comum, eles recordam os copos que trocaram num bar enquanto se tocavam, as beatas mais fumadas dos cigarros, o simples traçar e abrir de pernas despenteado, até o cheiro das madeixas dela que caminhava no raio de sol que entrou pela janela, tocando os corpos enquanto o olhar se cegava.
Pela praia o areal brilha como espelhinhos projectados por um céu solar, a máquina não pára, perto de um corpo afogado em lágrimas...
As ondas já cobrem os corpos, as profundezas do mar esperam o crime perfeito, as grutas tem tonalidades já conhecidas, que se amam com o olhar no bater da água. O afogamento está predestinado, escrito no livro mais importante e antigo da memória sexuado pelo tempo como uma utopia que se carrega pela vida (o amor). Os dois fazem o que é proibido, olham directamente para o sol por minutos, já cegos, partem nas águas mais pecaminosas que os habita, em todo um corpo.
A máquina pára por segundos, até que o homem encontra o mais profundo do mar, aquele que nenhum escrito pode definir num corpo real.
A praia agora já está cheia de gente, por onde já correm tantos movimentos oculares vulgares.
Já soltos do mundo vão a nadar, até as profundezas mais antigas das lendas do mar, encontram-se nos recifes com as pedras mais preciosas e cristalinas que o mar esconde, um tesouro deixado por piratas, a aliança dos corpos que se tocam até à morte.
A máquina pára…as teclas silenciam aquele orgasmo que se deu entre o céu e o mar, os passos seguem até a porta do frigorífico. Aquele ar pensativo não o larga e ao passar ao lado de um quarto desarrumado e decorado por uma alma inebriada no silêncio, que esboça um sorriso enigmático. Acaba por sentar sua alma naquela cadeira do costume, pousa o copo gelado, olha pela janela fechada que não ousou abrir pela manhã e de volta ao copo com o seu olhar nublado já por cima das nuvens, vê um Deus que nunca traçara à sua frente bem cravado no seu rosto.A mesa estremece, sem saber o porquê? -E tudo acaba!


Fim







Cristina Pinheiro Moita /Mim/

 
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Enviado por Tópico
Nanda
Publicado: 26/01/2011 21:49  Atualizado: 26/01/2011 21:49
Membro de honra
Usuário desde: 14/08/2007
Localidade: Setúbal
Mensagens: 11076
 Re: Teclas de uma utopia
Mimzinha,
Provaste aqui e agora o enorme talento que tens para a prosa.
Beijinhos
Nanda


Enviado por Tópico
Karla Bardanza
Publicado: 27/01/2011 02:08  Atualizado: 27/01/2011 02:08
Colaborador
Usuário desde: 24/06/2007
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Mensagens: 3263
 Re: Teclas de uma utopia
Estou com a Nanda.

Beijo

Karla B