Prosas Poéticas : 

Filmes

 
Enquanto faço por adormecer, vou retocando o filme da minha vida com lembranças ténues, leves e livres que me preenchem o pensamento me permitindo recordar cada palpitação atroz de vida passada.
Qual película provoca mais desassossego em mim do que esta que vou vivendo e me faz revirar na cama em meras voltas cuja agilidade de serem diárias já nem são tidas em conta nas minhas lembranças?
A inquietação da lembrança despoleta em mim um misto de desejos e repugnâncias cuja intensidade me dissolve e dificulta o meu adormecer. Esta forte intensidade faz-me arregalar ainda mais o olhar na escuridão quebrada pela luz nocturna dos candeeiros que trespassa a minha janela e torna o meu filme ainda mais taciturno e verídico.
Surgem filmes que acabam e ainda o balde das pipocas vai a meio, por não ter sequer existido tempo nem vontade de as terminar devido à forte atracção que o filme suscitou e o qual não queria de todo largar, literalmente.
Abraçada a estes filmes que me delineiam um sorriso tão durável quanto o meu acordar, vivo noites felizes que se evaporam no ar matinal que é frio e miseravelmente mau por me proibir de visualizar estas películas de vídeo constantes que me arremessam de sentidos e de transformações imaginárias de acontecimentos cujas alterações levam a finais felizes e cuja impossibilidade me amedronta.
No meu acordar, enquanto faço por ainda ser cedo o suficiente para me permitir sonhar recordações, quero apenas que a noite chegue novamente, prevenindo-me da vida agarrada que estou a levar cuja liberdade se escapula a cada instante, vida que não sei se sei viver suficientemente bem para deixar de querer viver presa nos filmes melancólicos nocturnos, para voltar a visualizar momentaneamente cada vislumbre vago de corações cheios e almas preenchidas de promessas de felicidade imortal.
Para já, resta-me esperar que o sol se ponha e que a aurora demore a chegar...

 
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Vera90
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