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O GATO BRANCO

 
O GATO BRANCO


Nasceu de uma gata qualquer e foi colocado no jardim da casa da senhora Lúcia. Ali foi sendo alimentado com leite na mamadeira até ficar mais taludinho. Cresceu com muito carinho de sua dona que morava só naquele jardim imenso. Solteira e decidida a viver assim por muito tempo, podemos imaginar o carinho e afeição que a senhora Lúcia dedicava a ele. Há algo no amor totalmente desinteressado, e capaz de sacrifícios, de um animal, que toca diretamente o coração daqueles que tiveram o prazer de tê-los.
O bichano chamava-se Chuvisco. Era um gato de tamanho médio, todo branco e de espantosa sagacidade. A amizade e cumplicidade entre ele e a senhora Lúcia era visível. Ele agora acompanhava todos os seus passos, de manhã, praticamente até a noite e ela logicamente adorava essa atitude felina. Se a sua dona fosse à cozinha, ele ia, se fosse ao quarto, ele ia, e assim eram os seus dias.
A luz do candeeiro iluminava a sala de leitura do velho casarão mais conhecido do bairro que moravam e de quando em vez lá estava o Chuvisco deitado todo à vontade em cima da cômoda, mas parecia um gato de porcelana chinesa, imóvel certas horas ou pulando e brincando com as bolinhas de papel que sua dona jogava no cesto de lixo, logo em baixo da escrivaninha, onde ela desenhava e rabiscava qualquer coisa, sem o menor sentido, somente no intuito de fazer o tempo passar. E por falar em passar o tempo, a senhora Lúcia e o seu gato Chuvisco iam se afinando cada dia mais. A senhora Lúcia sofria de constantes desmaios, provocado pela hipertensão mal controlada. Certo dia quando a encontrei desmaiada sobre a cama notei que Chuvisco lambia sua face vagarosamente, e com os meus chamados ela foi recuperando os sentidos gradativamente. Contando é difícil de acreditar na intimidade e conhecimento que eles têm.
O Chuvisco como bom felino era muito caçador e não podia ver um inseto ou até mesmo um passarinho que o abatia e levava o que sobrava do bicho para debaixo da cama onde dormia sua dona. Quando isso acontecia ele sumia às vezes uma tarde inteira e ninguém sabia dizer onde o Chuvisco estava escondido. Quando pela noitinha ele aparecia com cara de inocente podia contar que ficaria algum tempo sem aprontar, mais quando se esquecia do que tinha feito, inventava logo outra coisa ainda pior. A senhora Lúcia com a vassoura e a pá na mão, lá ia ela limpar e desinfetar o chão.
Este gato jamais perdia o seu charme e a sua elegância, mesmo diante de situações um tanto ao quanto embaraçosas. Não gostava de chuva, porém passeava pelos cômodos da casa com suas patas enlameadas sujando-a toda. A senhora Lúcia mais uma vez com um pano de chão úmido enrolado no rodo fazendo a limpeza devida. Chuvisco brincava com tudo que via, canetas em cima da mesa, os manuscritos de sua dona, revirava cestas de lixo, sempre alegre e majestoso, nunca triste, somente nos dias que a senhora Lúcia estava doente.
Chuvisco somente mudou um pouco seu comportamento quando a senhora Lúcia conheceu um homem de meia idade chamado Juvêncio, mesmo assim não se fez de rogado e dois ou três dias depois Chuvisco já estava amigo de Juvêncio que também gostava muito de animais, muito embora tivesse uma predileção por cães mais do que por gatos. E de um jeito ou de outro este gato esperto ganhou mais um admirador. Esta convivência pacífica e verdadeira perdurou por muitos anos.
A senhora Lúcia e Juvêncio quando estavam no quarto nos momentos mais íntimos do casal, Chuvisco estava do lado de fora da porta, à espreita, de tal maneira posicionado, que qualquer movimento diferente ele já espichava o rabo, como querendo participar no bom sentido do que estava acontecendo.
Assim como este, existem outros casos idênticos por aí, mas não com o mesmo teor de brilhantismo quanto o conto do gato branco.




JOSÉ CARLOS DE ARRUDA.


 
Autor
Camões-Carioca
 
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