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Então adeus

 
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Abres lentamente a persiana, enquanto estendida me deixo estar entre lençóis que de seda não sendo, sedentos estão por te ter de novo neles jazendo. O quarto, outrora oculto em sombras disformes, afoga-se na luz que de rompante nos rouba as réstias da noite. Forço olhos meus a manter-se cegos perante o amanhecer, tentando em vão prolongar o sonho que de fugaz se esfuma pelos ares. Terá mesmo de acabar? Esgotadas as razões para não enfrentar a manhã, deixo descolar de uma vez as minhas pesadas pestanas. Vejo-te agora na claridade. Contra a luz, rebate-se serena tua silhueta perfeita, absorta no quadro pintado por detrás da translúcida fresta envidraçada. Ali está a Serra deitada, num fresco mar de verdes ondas longínquas sobrepostas ao infinito azul celeste. Tal céu que não conhece fim, ou antes o tem num algures que de tão desconhecido se torna impensável. Ao contrário de nós, meu amor… Percorres a paisagem diante da janela com tua ávida vista, saboreando a doce montra de mundo que te aguarda; um sem fim de montes, cumes e sopés encantados por viver. O desconhecido devir dá forma a teus devaneios distantes, levando-te a levitar mais além. Ali, num lá que em meus modestos muros não te amarrará.

Bebo o sorriso que momentaneamente aflora às tuas faces, tentando inutilmente fazer sucumbir a sobriedade e assim abafar todas minhas sedes de ti. Sedes de seda, aquela que o breu nocturno me deixava devanear e que agora se converte num roto, pobre pano de linho em lágrimas manchado. A cama onde me deito range desconcertada ao meu soerguer, ferida e prestes a perecer em pedaços mil. Distante, no canto mais oposto, vestes-te pesarosamente e com vagar, evitando olhar-me apesar de me saberes já desperta. Raiou o Sol também para ti e, à luz dos sonhos rompidos, sabes bem que a hora da partida é chegada.

Não adianta adiar o adeus. Quebra amarras e voa de encontro ao teu céu. Mas, ao sair, cerra a persiana… E permite que o negrume me embale o choro e descanse minha dor.


 
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FlyHigh_Girl
 
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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 16/03/2009 23:19  Atualizado: 16/03/2009 23:19
 Re: Então adeus
"Ali, num lá que em meus modestos muros não te amarrará. "Só te posso dizer que me revejo neste texto e na tua forma de descrever.
ADOREI!

Abraço,
Vitória

Enviado por Tópico
Maria Verde
Publicado: 17/03/2009 00:41  Atualizado: 17/03/2009 00:41
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Usuário desde: 20/01/2008
Localidade: SP
Mensagens: 3489
 Re: Então adeus
o texto é envolvente. gostoso de ler!
muito bom! gostei de vir aqui.
beijo

maria verde