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A Penalização do Trabalho & A saúde sob a ótica do mercado (Saúde & Trabalho - Neoliberalismo, Partes VI e VII)

 

Ensaio: Saúde & Trabalho no Processo Histórico e no Contexto Político do Neoliberalismo

Parte VI - A Penalização do Trabalho.

Um dos temas mais debatidos e controversos, nos estudos sociais, dizem respeito às grandes mudanças operadas no campo do trabalho, particularmente aquelas ligadas ao desenvolvimento tecnológico.

O desenvolvimento tecnológico provocou profundas mudanças na atividade humana da produção, no trabalho.

O avanço na utilização da tecnologia, reduzindo o esforço físico e fazendo crescer de forma desmesurada o papel da máquina, fez com que a sociedade encarasse de modo diferente tudo o que se referia ao trabalho.

Essa discussão, entretanto vem gerando colocação de ordem política que excede os limite da ciência.

A introdução crescente de metodologias, instrumentos e máquinas alteram sobremaneira o quadro em que se dá o processo produtivo, interferindo até na velha contradição entre o labor físico e o labor intelectual.

Da mesma forma, o que se convencionou chamar nas sociedades mais complexas de alargamento de serviços, contribui para tornar o problema de discussão ainda mais difícil.

Não é de se espantar que surjam teorias como a de que “o proletariado caminha para a extinção, enquanto classe, portanto as posições ideológicas que repousam no papel eminente dessa classe devem aceitar o ponto final de sua razão de ser”.

A lógica nessa concepção teórica viria, não somente dessa aceitação tácita, como da aceitação do fato de que a sociedade, não mais existindo classe operária, seria composta apenas pela burguesia.

É evidente que colocada desta maneira, a discussão perde em seriedade, mas é inegável o fato de que ocorrem mudanças na área do trabalho.

A categoria trabalho não está extinta, mas as suas variações, que se processam amplamente na sociedade, devem ser objeto de estudo e dimensionamento.

A principal problematização está na permanente variação e as discussões que as acompanham, naquilo que Karl Marx definiu como “composição orgânica do capital”.

É justamente ela que deve ser objeto de preocupação para políticos e economistas, porque dela advém reflexos profundos para a sociedade.

E a propósito, uma das áreas em que o neoliberalismo agrava velhas posturas reacionárias é o seu “horror ao trabalho” e tudo que decorre dos seus reflexos, na economia e na política.

A tese neoliberal de que a inflação, uma das mazelas da sociedade dividida em classes, seria oriunda do salário, isto é, da remuneração ou do valor agregado do trabalho.

Aumentos ou reposição de salários sempre foram tidos, como impulsos inflacionários.

Daí decorre o clássico tratamento de reduzir direta ou indiretamente, a remuneração do trabalho quando se trata de conter a inflação.

O neoliberalismo não só levou às últimas conseqüências, o processo de despolitizar o esforço do proletariado para deter a espoliação do trabalho, levando as massas operárias à greve.

Estas, segundo a nova ordem vigente, não podem ter características políticas, devendo se restringir ao nível reivindicativo.

Fixa normas mais adequadas ao modo de pensar neoliberal nas relações trabalho e capital, como o entendimento direto entre o salário e quem paga, com o antigo Estado no papel de árbitro, agora fora da questão. Obviamente, o lado mais forte, o capital baterá o outro, o trabalho.

Nesta concepção, similar ao entendimento de que o salário causa infração, o trabalho é algo que a tecnologia moderna tem condições de substituir.

Na mesma assertiva de que o proletariado tenderá a desaparecer, também o trabalho em breve deixará de existir.

O desenvolvimento tecnológico exerce influência sobre a composição do capital e a estrutura da sociedade.

As alterações na posição relativa de classes quanto à participação de seus componentes na repartição da riqueza produzida pelo trabalho.

Os avanços tecnológicos só proporcionam estas mudanças quando abalam essa estrutura, porém em alguns casos, não a abalam e podem mesmo reforçá-la.

No Brasil, a sólida resistência das velhas estruturas oligárquicas ocasionou uma dessas anomalias.

O aspecto mais grave que o neoliberalismo brasileiro apresenta quanto ao trabalho e a sua fobia pelo trabalho, ao longo de sua arrasadora implantação são a enormidade taxa de desemprego, que hoje assume aspectos dramáticos.

Parte VII - A Saúde sob a ótica do Mercado.

Um dos aspectos mais perversos na prática neoliberal é o tratamento dado às políticas sociais.

Tanto a saúde quanto à educação pública tem sido duramente atingidas por cortes nos gastos sociais e medidas restritivas na utilização de serviços públicos.

A própria OIT – Organização Internacional do Trabalho, quase centenária, que normatizou uma série histórica de convenções, tratados e recomendações acerca das relações de trabalho, se vê hoje pressionada pelo empresariado assentado na poderosa OMC – Organização Mundial do Comércio, a rever ou flexibilizar muitas destas clássicas convenções, como a da Proteção à Maternidade.

Os sistemas únicos de saúde organizados segundo os preceitos de ALMA-ATA, URSS-77 e da OMS, previstos na Constituição de diversos países do 1º Mundo, como Inglaterra, França e Canadá e mesmo, no Brasil, vem sofrendo sistemático ataque neoliberal.

A saúde virou um grande negócio, os procedimentos em saúde têm valor de mercado, expandem-se os planos de saúde e o setor conveniado ao próprio governo. Por outro lado, o processo de sucateamento e desmantelamento da rede pública segue em curso.

No tocante à saúde do trabalhador, acumulam-se índices alarmantes de acidentes de trabalho fatais e com seqüelas nos países em desenvolvimento, especialmente na força de trabalho precarizada.

A prestação de serviços em suas diversas modalidades - como exemplo a terceirização e as cooperativas - aumenta o grau de precarização nas relações de trabalho e de saúde da força de trabalho.

Dentro de um dos pressupostos do neoliberalismo, a eficiência no mundo da globalização é medida pela capacidade de reduzir postos de trabalho, produzir mais com menos efetivo de pessoal.

Em ritmo nunca dantes visto, a falta de oportunidades reais de trabalho, leva milhares de jovens e adultos em idade economicamente ativa e, mesmo aposentados, a disputar o saturado mercado da informalidade.

Quem trabalha, é seduzido pelos planos de incentivo à demissão voluntária, a deixar seu posto de trabalho, para tentar a vida na livre iniciativa.

Os desajustes sociais, a desesperança, o desemprego são partes de um mesmo enredo, engendrado pelo modus operandi do neoliberalismo.

Aos quadros clássicos de doenças profissionais ou do trabalho que assolam os obreiros, somam-se outras formas de manifestação de desequilíbrios, como o sofrimento psíquico, o estresse e outras formas de distúrbios da saúde mental.

A injustiça social nestes "tempos de cólera" atinge seu cume, com a banalização do “fazer”, a não identificação no produto final do trabalho e a incerteza e insegurança no horizonte de vida.

Afinal, qual o valor do trabalho, na sociedade moderna?

AjAraújo (Alberto José de Araújo), MD do Trabalho
Doutor em Ciências em Engenharia de Produção
COPPE/UFRJ.

Obras Consultadas:

1. Bartholo JR., RS Os Labirintos do Silêncio. Ed. Marco Zero Ltda. 1986.

2. Sodré, N W. A Farsa do Neoliberalismo. 6ª Edição. 1999. Graphia.

3. Mendes, R. Patologia do Trabalho. Atheneu. 1996.

4. Dejours, C. A banalização da injustiça social. Editora da FGV. 1999.

5. Antunes, R. Os Sentidos do Trabalho. Boitempo Editorial, 1999.
 
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AjAraujo
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