Poemas : 

Quando não me apetece escrever a ponta de um corno

 
Quando não me apetece escrever a ponta de um corno, sou gazela devorada pelo apetite voraz da fera, sou a fêmea com os lábios borratados de sangue, caçando por mim.
Quando não me apetece escrever a ponta de um corno, sou o pássaro que morreu de fome numa gaiola, a mão que se esqueceu do gesto.
Quando não me apetece escrever a ponta de um corno, sou um mundo bárbaro, um sorriso por andaimes, uma escalada de morte, a guerra.
Quando não me apetece escrever a ponta de um corno, explodem aviões por minha culpa, Deus é apenas uma ideia guardada num frasco. Caem torres gêmeas por afinidade.
Quando não me apetece escrever a ponta de um corno, as criancinhas violadas são expostas em montras, os pedófilos crucificados em praças.
Quando não me apetece escrever a ponta de um corno, as certezas são perversas mentiras, o amor uma espécie de prostituição.
Quando não me apetece escrever a ponta de um corno, uma assembleia é uma reunião de bandidos, uma República uma burguesia descarada.
Quando não me apetece escrever a ponta de um corno, sou abutre recolhendo as letras que sobraram da carcaça, uma labuta de morte pelo derradeiro pedaço.
Quando não me apetece escrever a ponta de um corno, descubro um vibrador na alma, um coito interrompido no mundo, e definho masturbando-me.


O meu verdadeiro nome é José Ilídio Torres. É com ele que assino os meus livros.
Já publiquei 12 obras em géneros diversos: crónica, romance, conto e poesia.
Foi em 2007, aqui no Luso, que mostrei pela primeira vez.

 
Autor
SilvaRamos
 
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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 06/06/2014 12:43  Atualizado: 06/06/2014 12:43
 Re: Quando não me apetece escrever a ponta de um corno
Imagens fortes, mas escrito com a maestria perfeita, na ponta dos dedos!

Obrigada!

Gostei!

Beijos,

Anggela

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 06/06/2014 13:05  Atualizado: 06/06/2014 13:05
 Re: Quando não me apetece escrever a ponta de um corno
Espumas barulhentas!
Espero que a sereia saiba aproveitar
esse mar revolto.
Sua alma me surpreende...
Sua alma me assusta...
Sua alma me encanta.


Abraços