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Óperas, guia para Iniciantes - O ANEL dos NIBELUNGOS - Ciclo completo com as quatro: 1. O Ouro do Reno; 2. A Valquiria; 3. Siegfried e 4. O Crepúsculo dos Deuses. Richard Wagner - Continuação

 
Continuação...

E o povo recebe com júbilo a noticia de que o Rei dos Gibichungs irá se casar em breve com a Princesa das Valquírias e filha dileta do “Rei dos Deuses”.
Pouco depois, o barco que traz o casal aporta e Gunther exibe, orgulhoso, a sua bela noiva, sem sequer imaginar, haja vista que Hagen tudo lhe ocultou, que a mesma tornou-se uma proscrita por ter desobedecido ao pai Wotan e que já é a mulher de Siegfried.
Ainda em estado de choque, Brunhilde nem escuta o que dizem e o que se passa à sua volta. Tudo lhe parece um sonho ruim, do qual irá despertar em algum momento.
Em seguida é apresentado aos cidadãos o outro casal de noivos que em breve irá se casar: Siegfried e Gutrune.
Nesse instante, ao ouvir o nome de seu amado, Brunhilde volta à consciência e o seu olhar encon-tra-se com o dele, sem que ele demonstre reconhe-cê-la. Então, uma terrível dor apodera-se de seu coração e ela presume ter sido preterida, em razão da fortuna e da posição social de sua rival.
E mais amargurada fica, quando percebe a falta do “Anel Encantado” que Siegfried havia lhe deixado como empenho de seu amor por ela. Alucinada, acusa a Gunther (pois essa era a aparência de Siegfried ao resgatá-la) pelo roubo e insulta rudemente ao seu ex-noivo, chamando-o de traidor, venal, oportunista etc., sem ao menos supor, que ele também é uma vitima do sórdido estratagema urdido por Alberich e por Hagen.
Por fim, incapaz de se conter, grita que Siegfried é o seu verdadeiro marido e não o rei Gunther.
Ante o desconcerto geral, Siegfried pede a lança que Hagen segura e jura sobre a arma que todas aquelas acusações de Brunhilde são falsas.
Em resposta, ela avança sobre a mesma lança e pro-fere a seguinte maldição: “Arma sagrada! Que tragas a morte a Siegfried que jurou em falso sobre ti”.
Porém, inocentemente, o herdeiro de Siegmund não se incomoda, pois acredita piamente que a verdade está consigo e só recomenda que Gunther provi-dencie ajuda médica à sua futura esposa, que está visivelmente perturbada. Em seguida, toma Gutrune pelo braço e deixa a cena.
Ficam Hagen, Brunhilde e Gunther. Atônitos, os dois últimos mostram-se ansiosos para esclarecer os fatos. Para Hagen, tudo está perfeito.
Em comum, os três tem interesse em testar e/ou em punir Siegfried. Gunther, para ter certeza de que ele não o enganou; Brunhilde, para vingar-se da traição e Hagen, claro, para reaver o “Anel Encantado”. Assim, combinam testar e eventualmente punir o herói com a maior brevidade possível.
Para tanto, Brunhilde revela que o ponto fraco do herói fica nas costas e, por isso, ele ficou invencível até então, já que sempre o protegeu cuidadosamente de todos os inimigos.
Hagen reconhece que será dificílimo vencê-lo, mas que será possível que “um acidente de caça” o eli-mine.
Gunther, porém, é contrário a essa traição covarde, pois ainda não tem certeza de que foi enganado e, ademais, selou com o futuro cunhado um pacto de amizade fraterna. Contudo, quando Hagen lhe con-ta sobre os poderes do “Anel Encantado”, a ambi-ção se sobrepõe aos seus escrúpulos e ele deixa de ser contrário à ação.
Dessa sorte, eles programam uma grande caçada para a manhã seguinte, na qual acontecerá o assas-sinato de Siegfried.
É o fim do segundo ato.
§§§
O terceiro ato é encenado na representação de uma clareira na floresta, às margens do rio Reno.
A caçada programada aproxima-se do final e Sieg-fried passeia despreocupadamente pelas margens do rio até ser interpelado por Woglinde, Wellgunde e Flosshilde, as “Donzelas do Rio”, que vivem em constante lamentação desde que deixaram o seu tesouro ser roubado por Alberich.
Agora, sabedoras de todos os fatos que sucederam e de que o “Anel” está com Siegfried, imploram para que ele lhes devolva a joia e se livre da terrível maldição que o fará perder a vida naquele mesmo dia.
Porém, o herói que nada teme, limita-se a pilheriar de suas súplicas e advertências e elas desistem, voltando para o fundo do rio. Entrementes, o som da trompa anuncia a chegada de Gunther, de Hagen e de vários outros caçadores, vaidosos de suas po-bres presas.
Ainda rindo das “Donzelas do Rio”, Siegfried conta aos recém-chegados o diálogo que travaram e torna a desdenhar das advertências que elas lhe fizeram. Gunther, porém, não compartilha de seu descaso e se mostra aterrorizado pelo vaticínio funesto, pois sabe dos grandes poderes que as ninfas possuem.
Hagen, por outro lado, executa mais um lance de seu plano macabro ao dar uma estranha bebida a Siegfried que lhe devolve a consciência e a memó-ria. Emerso, então, do torpor e da perturbação, ele atende a sugestão do anão e se põe a falar sobre a sua infância com Mime e de como o matou após compreender que ele só o usava; de como abateu o dragão em que Fafner se transformara; da “Espada Mágica” que herdara do pai, da linguagem dos pás-saros e, finalmente, do encontro com Brunhilde.
E ao citar do nome de sua bem amada, desperta em Gunther uma enorme fúria, pois sem saber dos fei-tiços de seu Conselheiro, o rei dos Gibichungs julga que Siegfried esteja mentindo descaradamente. Acredita, em sua ingenuidade, que quando Bru-nhilde esbravejou, ela estava coberta de razão e que não se tratava de um delírio mental. Sim, Siegfried era um trapaceiro que o enganara!
Nesse instante, dois corvos sobrevoam o local e Siegfried vira-se para observar-lhes, dando chance para que Hagen o atinja pelas costas com sua a lan-ça. Ferido em seu ponto vulnerável, cai agonizante, mas antes de expirar o último suspiro, compreende a armadilha em que caiu e o grande mal que invo-luntariamente causou à sua bem amada e entoa o célebre “Cântico do Adeus” à Brunhilde.
Assistindo a todo aquele sofrimento, Gunther per-cebe que o herói foi apenas mais uma vitima das artimanhas de Hagen e parte, decidido, à procura do mesmo para lhe dar o merecido castigo. Porém, o anão já havia escapado. Ao soberano só resta dar um enterro principesco ao herói.
Lenta e ritualmente os seus vassalos transportam o corpo ao som da conhecidíssima “Marcha Fúnebre”. E além dela, outros temas melódicos que sim-bolizam a raça heroica dos Walsungs e o “tema do fogo” de Brunhilde são executados em apenas dois toques, numa soberana representação da inexorabi-lidade da morte.
É, seguramente, uma das partes melódicas mais tocantes de todo o grande ciclo e um dos momentos mais marcantes e apreciados pela plateia, que, em geral, é tomada por grande emoção.
Desse modo, encerra-se a primeira cena.
A segunda cena é ambientada no hall do Palácio Real dos Gibichungs.
Gutrune anda pelo aposento de modo mecânico, demonstrando a terrível aflição que lhe aflige. Pou-co depois os seus piores temores são confirmados quando adentra a cena o cortejo fúnebre.
Ensandecida, ela ataca o seu irmão Gunther e o acusa pelo assassinato de Siegfried. E só a muito custo ele consegue acalmá-la e convencê-la de que o verdadeiro culpado é Hagen. Nisso, o pérfido anão ressurge e diz em sua defesa, que matou o herói apenas para cumprir a lei que determina que o indivíduo que jurar em falso sobre uma arma, deve-rá ser morto pela mesma.
Dura Lex, sede Lex. Sim, é a Lei! E ninguém, tam-pouco os irmãos, podem contestá-la e acusá-lo. Aproveitando-se, então, dessa resignada submissão de todos ao princípio legal, ele exige o “Anel Má-gico” como recompensa por ter executado o artifí-cio legal.
Gunther, todavia, nega-se a atender a sua exigência e Hagen o mata. O seu temor de que o seu plano falhe justamente quando estava tão perto de se con-cretizar, rompe-lhe qualquer temor ou racionalidade e ele não hesita em vilipendiar o cadáver de Si-egfried para roubar o desejado “Anel”; porém, co-mo se fosse um aviso do Além, o braço do herói levanta-se e ele se afasta aterrorizado.
Enquanto isso, Brunhilde retorna à cena e como já está ciente de toda a verdade exige que o corpo de seu amado seja ritualmente incinerado junto ao Reno, numa alta pira, à altura de seu heroísmo e de sua condição de semideus.
Depois, retira carinhosamente o “Anel Encantado” das mãos de Siegfried e agradece às “Donzelas do Rio” por lhe terem revelado toda a verdade, dizen-do que em breve lhes devolverá a cobiçada joia, totalmente purificada pelo fogo redentor.
Nisso, os vassalos terminam a pira funerária e co-locam o corpo de Siegfried em seu topo, donde logo a sua alma libertada voará.
Montada em seu fiel cavalo, Brunhilde apanha uma tocha e acende a pira; depois, atira-se à mesma** para morrer junto com seu amado, enquanto entoa a sofrida ária “Cena da Imolação”. Sacrificando-se, redimirá os deuses e os homens.
É uma cena dantesca e para aumentar o impacto, o rio Reno transborda e as águas derrubam todo o reino dos Gibichungs.
Nas águas, as “Donzelas do Rio”, veem aproximar-se o corpo inerte de Brunhilde, que dessa forma insólita vem devolver-lhes o Anel dos Nibelungos.
Recuperando-o, apressam-se em mergulhar e logo em seu encalço surge um alucinado Hagen, que escapou da inundação e que não se conforma em ver seu objeto de obsessão escapar-lhe novamente.
Entra intempestivamente no Reno, mas ele não é páreo para os poderes das ninfas, que logo o agar-ram e levam para o fundo do rio, de onde nunca mais voltará.
E como para confirmar o desaparecimento da mal-dição, Flosshilde emerge jubilosa, exibindo o ex Anel dos Nibelungos já purificado e livre das mes-quinhas cobiças humanas.
Noutro ponto da cena, sobre as ruínas do ex Palácio dos Gibichungs, avista-se um céu cor púrpura e, no pico de uma poderosa montanha, as chamas que consomem o outrora poderoso Walhalla, a morada de Wotan e de sua corte. Findaram-se os antigos deuses.

Que os homens façam triunfar o amor e a justiça!

Assim, com esse brado de renovada esperança no destino humano, Wagner encerra a sua grande obra, cuja mensagem continua tão vibrante, quanto foi em sua origem.



Nota do Autor* - Em verdade, como se recorda o leitor (a), esse estranho é Siegfried transfigurado em Gunther, graças aos poderes do “Elmo Mágico”.

Nota do Autor** - nessa cena é possível ao leitor (a) obser-var uma provável referência à antiga cultura Hindu, onde se observava o ritual chamado “Satee” que ordenava que as viúvas fossem imoladas na mesma pira fúnebre de seus fale-cidos maridos.

Lettré, l´art et la Culture. Rio de Janeiro, outono de 2015.


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FabioVillela
 
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