Poemas : 

Parte de Dentro

 
Com urgência,
Uma guinada cá dentro.
Uma força sem opostos.

Limpo o vidro encharcado
E limpo-o novamente
Para lhe remover o nevoeiro.
Espero!
Deixo passar estação, paragens
No desejo de me alimentar,
E alimento; numa fracção de segundo.
Outra vez perto, outra vez longe.

Abstenho-me,
Aumento a fome.
Puxo do cigarro para matar a sede
Enganando-me.

Visito-te para me acalmares.
Respondes com ideias céleres
Em si, que me projectam
Para lá de além.

Alimentas a minha vontade recalcada
De partir para longe
Adiando a definitiva.

Dás-me mais sonhos sem conteúdo,
Esperanças vãs.

Compro mais um livro que não vou ler,
Talvez me surpreenda!
Tenho o cérebro cheio
De princípios de histórias,
De primeiras páginas;
Algumas inacabadas
Quem sabe, para sempre.

Limpo a chuva do meu relógio
Para deixar passar o tempo:
Ele não passa, embaciou.

Solto esta criatura?
Este louco fechado
Em regras?
Ou deixo-o continuar a consumir.
Como disseste, mordo-me por dentro.

Acho que tens razão
No que deixas no ar.
Não deveria ter nascido;
Não agora; não neste tempo
Onde tudo converge e se afasta.
Este tempo que me deixa morto.

Quero mergulhar em ti
Com um medo de to pedir.
As minhas águas são turvas,
Paradas, opacas, escuras:
Tão concretas como um objecto sólido.

Nunca te deixaria mergulhar em mim.
Perder-te-ias para sempre!
Serias uma criatura consumida
E este lago não deixaria rever
O teu corpo tão sagrado a mim.

Estou cheio de "não seis",
Imundo de dúvidas arrecadadas,
Empoeirado como se multiplicado
Por cem os meus anos de vida.
Tão jovem - dizem.

Jovem é o velho que vive!

Até quando?

Sou feito de várias partes
(Assim o deduzo)
Todas tão saturadas,
Tão bafientas
Que sei onde estão pelo cheiro
Que me sufoca.

Nunca as poderei apontar.
Isto é parte do que vai cá dentro.
Uma parte mínima,
Um vómito a principiar.

Nunca gostei de regurgitar.
Por vezes temos que fazer
Aquilo que não gostamos.
A vida é bela!

06/03/2007
 
Autor
Hugo Cabelo
 
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