Poemas : 

Último poema

 
Último poema

Que sequem na garganta os dedos
As vozes e o canto na boca
Que não se acendam velas no escuro
Nem se enterrem os medos

Que este tempo já caiu de maduro
Por todos os lados da fruta oca
Primavera de Praga nos vinhedos

Que se desfaçam os noivados
Se mande embora a banda e os convidados
E os políticos maltrapilhos do lucro

Que se façam gente os malfadados

Que haja uma rosa sem água
Um deserto inteiro num vaso
Um doce ruir da fraga
E o presente seja um quase nada do acaso

Que haja um cego em desequilíbrio
Uma falsa passadeira de peões na estrada
Um crime sem castigo servido frio

Que após a morte em nós das crianças
Nunca mais soubemos tecer os afectos
Nunca mais soubemos as danças
Os nossos sonhos passaram a ter tectos

E foi aí, quando nos sobrou só a dor
Quando só nos restava a resignação
Que o poema jogou a nosso favor
E nos cortou a respiração

in: «Os poemas não se servem frios» 2010


O meu verdadeiro nome é José Ilídio Torres. É com ele que assino os meus livros.
Já publiquei 12 obras em géneros diversos: crónica, romance, conto e poesia.
Foi em 2007, aqui no Luso, que mostrei pela primeira vez.

 
Autor
SilvaRamos
 
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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 18/06/2014 22:18  Atualizado: 18/06/2014 22:18
 Re: Último poema
Amei a leitura do poema
Parabéns!
Abraços

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 19/06/2014 02:46  Atualizado: 19/06/2014 02:46
 Re: Último poema
cara..gostei!!!

"Que após a morte em nós das crianças
Nunca mais soubemos tecer os afectos
Nunca mais soubemos as danças
Os nossos sonhos passaram a ter tectos" aonde foi parar nossa inocência??

Excelente!