Prosas Poéticas : 

Água viva (Clarice Lispector)

 
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Nasci dura, heroica, solitária e em pé. E encontrei meu contraponto na paisagem sem pitoresco e sem beleza.

A feiura é o meu estandarte de guerra. Eu amo o feio com um amor de igual para igual. E desafio a morte. Eu – eu sou a minha própria morte. E ninguém vai mais longe.

O que há de bárbaro em mim procura o bárbaro e cruel fora de mim. Vejo em claros e escuros os rostos das pessoas que vacilam às chamas da fogueira.

Sou uma árvore que arde com duro prazer. Só uma doçura me possui: a conivência com o mundo.

Eu amo a minha cruz, a que doloridamente carrego. É o mínimo que posso fazer de minha vida: aceitar comiseravelmente o sacrifício da noite.

Clarice Lispector, In: Agua viva, p. 44.
 
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AjAraujo
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