Poemas : 

verão 17

 
o mar irrompe subtil
arrastando as correntes frias das profundezas
para libertar o amor quente em vagas sobre ilhas encantadas

repouso e silêncio
escutando os búzios que ecoam
agora que descemos a montanha de luz

dia suave e cálido
procurando essência interior

onde a lua desagua sobre o sol
inspirando alquimia de sentidos e razões

quando as flores sussuram emoções
e é palpável a energia envolvendo os corações

o fogo colorido na noite em cascata d'ouro
anuncia minha cidade de perdição
é bela a vida! é chegado o verão!

reformulação do beijo em combustão
entre raízes e sopros de emoção
buscando a razão do sonho e da ilusão

o rugido interior, a força primal, o pêlo flamejante
animal palpitante que se anima com o calor
e chora a doçura perdida em flor

fios do destino na mão
ponderando a magia, emanação fulgurante
da fantasia, da volúpia que sussurra o verão

coração de manjericão
sorrindo insone de acarinhar a vida
e se imaginar a brilhar no horizonte dos sentidos

iogurte natural e lychees perfumados
no doce sabor de acordar e saborear
puro cacao, a amargura selvagem,,,

trilhos de afecto através do meu coração
príncipe dos mares, cativado por sereias,,,
desceu fundo a ilusão sobre a realidade

precipitação e golpe profundo
num só momento atravessando toda a pele
nervo interior intacto,,, tão belo e fecundo...

palpitações
divagações, desejos, hesitações
distâncias momentâneas embarcações

a palavra e o silêncio convergem
no mais íntimo sentido do pensamento
colidindo na margem do instinto das estrelas

o que em mim sobra, fulgura e se reaviva
para imprimir gestos, suaves toques de carinho
e cuidar o tempo, o silêncio e o som em que respiro

ter a coragem de brotar do interior da terra
florescer e raiar, acreditar e prometer
voando no vento em volúpia

quando tudo se desfaz
num fogo voraz de lágrimas
a vida foge e flutua longe de sentido

correr para casa, correr sem fim
num mundo incandescente de sorrisos

guizos que ecoam entre o sonho e a vertigem
um pouco de fôlego para encantar a noite

tempo precioso e o mar tão calmo...
embalo suave na espuma do abraço...

sono profundo, dor que se arrasta...
fragilidade extrema e condescendência

amor que avive o coração e lhe instile coragem
na voragem sentimental dos elementos
quando invadem pele adentro e ardem...

sombreados arrebatamentos de cristal
tilintando e chorando na brandura do mar
adormecido entre o leite e o leito do sonho...

imparável, de tarefa em tarefa, fera em fera
mundo em mundo, momento a momento

a degladiar a expressão de ser, sentir, sofrer

momento de vertigem de amor e de mar...

mergulho e abraço
do coração da noite ao raiar do dia

o mar a crescer

nuvens e desafios
preparação, planeamento, implementação
excentricidade, comoção, sobre a realidade

caminhar só pelo mundo
percorrer, sentir, perder, falhar, chorar
na extremidade da doçura encontrar saída...

impulso colossal de um oceano
o seu dorso elevando-me, acarinhando e nutrindo...

voo, viajo, inflinjo a velocidade sobre o meu corpo quando a alma infla sua vela delicada ao vento da paisagem

chego trémulo
mergulho infindo e faiscante
nesse instante maravilhoso e ébrio de paixão

exaustão de tanta fuga e encontro
um momento de sono e novo fôlego
em devaneios pela terra encantada...

quero deslizar como um rio até ao mar
saboreando cada curva do percurso
cada impulso na corrente do meu pulso

caí, fiquei dorido mas não parti
a pedra e a terra do impacto fundem-se em mim

a minha ilusão de desolação na solidão
é imaginar respirar e cantar para amar

o espírito fulge, exalta, amplia o olhar
ao longo do rio, sobre o mar no dorso solar

todo o êxtase de meandros que estreitam
entre o sonho e a pele, na profundidade
em que os beijos me afundam...

elementos que borbulham, rasgos, lábios...
convulsões de embriaguez e naufrágios...

vigilante do coração procurando substância
no desacordo emocional resvalando em voo

a vibração que percorre o meu corpo
da noite profunda arremessado
em brilho líquido para a luz fulgente

agitação e força acordando a vontade
de desejar e ser a amplitude dos sonhos
mesmo quando soçobram nas espumas

tensão máxima sobre o corpo extenuado
que luta por erguer e nutrir seu pomo d'ouro

eis a vida renascida na árvore do navegante
cruzando o coração e rasgando as águas...

até às imagens se incendiarem no arrebol...
e a noite descer para adormecer quem chora

crepúsculo de vénus
ante a aurora encarnecida de amor

ao resvalar no sonho vivificando a solidão

escorrer como lágrima no bosque do coração

aguardando o momento da erupção da terra
entre o orvalho, a memória e a ilusão volátil

lua cheia de cor
a tinta a correr
em breve carícia

bem ao centro do coração despido em luar

minha unção, meu suave balouçar...

imaginar e sentir, fluir e navegar...

tempestade colossal, de vento e de fogo,,,
ardente, visceral, na profunda essência,,,

sobre vivência, coincidência, renovação,,,
assunção, coerência, penitência ou não...

persistir na pulsação, nos veios e nas veias
que partem do coração e se estendem
pela vida

mar e mergulho, marulho e respingo solto no ar

violência intensa, rumor de revolução,,,
reconexão com um passado perdido na bruma,,, caruma que estala nos dedos,,,

aflição, sufoco, realização sobre o tempo,,,
fulminante e áspero, o desespero cândido,,,

entre o fumo e a cinza a torre sobre a praia...
subindo e descendo degraus de melancolia...
com o coração na mão e a vida por um fio...

tensão que se despenha em fervor de lágrimas
como um cílio na noite de vento e secura...

estou a vestir a armadura e a polir o escudo
para enfrentar o último sopro de fogo

entre a bruma à entrada da floresta ígnea...

seguindo o instinto, cumprindo o trilho
e abrindo, coração e alma, ao que sinto

o fado segue-me, o fado chama-me sem fim...
uma e outra vez ergue-se a voz na noite afim
ao desengano que abana a tontura em mim...

nova lua, novo sangue, crescente na lâmina
novo ânimo, à floresta que renasce por amor
e a dor que tanto anseia, só ateia novo fogo...

quanto cresço e embalo das cinzas memória
no leito de saudade e desvelo, meu zelo velo

o que ontem fui não mais serei outra vez, cor
e o que vês, neste reflexo, espelho meu, é dor

lenço branco, manto negro, aspirando cinza
que devolva à terra de minha alma a tinta...

ansiedade de chegar e dar, prover, regenerar

agito o desespero, confronto, folhas e falhas
que me caiem, até desfalecer num sopro...

quero serenar, ser mais doce e terno, suspiro

terra que me chama, planeta d' árvore e mar
a bailar como criança nas suas vagas e asas...

coração pulsante da floresta na noite de luar
entre a ursa e cassiopeia beijo a estrela polar

fervo, excedo, no limite do sonho expludo...

rearranjo o espaço, limpo, organizo o sonho
de céu e luar, debruo camadas de proteção...

e agora que o sol quase cai, qual o mel ainda,
lentamente gotejando, para me encontrar...

resguardo do impacto, entre essências, sons
e névoa... que dissipo lentamente até soprar

noites de pesadelos sucessivas e a ansiedade
sinfónica, ululante, arrastando ondas e luar

esvoaçando entre amoras e malvasia dorida
para lavar, pintar, aparar e viver a lua cheia

os lábios escorrem o sangue da insónia feroz
o mundo muda sob as estrelas e a boca é foz

dançando no coração da floresta virgem, sol
flor tão bela desenhando o sonho sobre mim

ilusões de esgrima entre copas cintilando...
a estrela arquejando entre folhas e agulhas...

banho-me em lágrimas que escorrem lençóis
de prazer e luar, a noite suspensa num barco
correndo a floresta docemente, em pés de pã

agora a hora devora o pouco que sobra no ar

penas caiem com as folhas e a rede eleva-as,
os pés firmam sobre o tapete de galhos rubro
quando âmbar reflete tempestades passadas

tento organizar com grande contenção,,,
preâmbulos de sonhos e ligações elementais

elevar-me na humildade das raízes da terra
que em breve descerá às profundezas cruas
de penumbra e frio, entre os corpos celestes

emoção gotejando dos meus olhos d' orvalho
a água correndo tão próximo, meu rio de lua
tua candura ao remares sobre o mar de uvas

desespero no pântano, de vapores sulfúricos
o tempo dolente esperando o sonho de luar,,,
bambuliante intranquilidade de asas negras

carvalhos revolvem-me entranhas e limpam
agudamente, a alma carregada de miragens,
viagens por santuários e florestas da virgem

choques momentâneos, faíscas de fogo fátuo,
abalos súbitos reclamam serenidade e sonho
soprando gentilmente pelos seres e pela vida

floresta que liberto, voando em asas carmim
através de horizontes longínquos, sustém-se,
a esperança do reencontro, além deste sopro

vento suave do espírito no bosque iluminado
de candura e desejo, ensejo, por doce alvura,
a ventura de meu coração nas vagas se eleva
e o que leva, já só responde por si, triste fado

pedaços rasgados de minha alma, de tortura
e desespero, creio no sangue que vos escorre
e deposito no altar, cornucópia alada de mel

longe dos sonhos de vã ilusão, soluçando sal
sobre as feridas que me rasgam, vaga de fel,
teias que me cobrem a face e afagam ardor,,,

rendido ao amor espiritual, a luz, o perfume
brotando em cascatas ressoando incessantes

e o abrigo da minha alma recolhe em cachos
para levar pela noite todo o dia num só trago

murmúrios alongam o poente incandescente
enquanto a cidade sente e inscreve memória

 
Autor
xibchel.
Autor
 
Texto
Data
Leituras
977
Favoritos
0
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
0 pontos
0
0
0
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.