BAR

Irmão Henrique,

Acredito que antros como tavernas, lupanares e bares sempre estiveram presentes na vida dos poetas. Estes lugares de hábitos desregrados parecem atrair estes anjos caídos, que somos nós, eternos prisioneiros das palavras e das emoções. Desde de Sá de Miranda, Camões, passando por Pessoa e Torga, em Portugal; por Gregório de Matos, Álvares de Azevedo, Fagundes Varela e Vinícius, cá no Brasil - isto só para citar alguns nomes. Manuel Bandeira, que não era dado a excessos etílicos, escreveu num poema: "Ainda bem que existe o álcool na vida da gente." Ainda bem. Ainda bem que existe esta falsa alegria dos bares, dando vida, ainda que de maneira cruel, a este milagre chamado poesia. Grato pelas palavras, irmão poeta. Sempre grato,

júlio s.

flavio, meu amigo:

suas palavras são sempre de incentivo. há anos que tento meu espaço. mas no meu país o poeta é visto como um ser satânico. primeiro, o assassinam; depois, vão incensá-lo. muitos amigos meus, caso de álvaro alves de faria, estão publicando em portugal. álvaro ganhou espaço na universidade de coimbra, contando com a amizade da professora graça capinha, da faculdade de letras, e trazendo alguns autores portugueses para o brasil - fiz uma leitura dos meus poemas com a portuguesa teresa rita lopes. se eu tiver oportunidade, não tenha dúvida, vou preferir publicar aí, apesar das tiragens serem menores do que aqui no brasil. no brasil, a poesia só é valorizada depois que o autor morre, foi o que aconteceu com a excelente hilda hilst, taxada de imoral, pornográfica, louca e alcoólatra enquanto estava viva. agora a editora globo está lançando a obra completa dela. o que adianta, se ela não chegou a ver estas reedições. outra coisa: seja poeta, seja prosador, se você não cair na simpatia de alguns críticos canalhas da folha de s.paulo, por exemplo, você está fodido. quando eu trabalhava nma folha e lancei meu primeiro livro, em 1990, não deram uma só linha a respeito. o estado de s.paulo, jornal concorrente, dedicou meia página. acho que o meu caminho na literatura está aí, no seu país, de onde vieram meus antepassados, embora ache a poesia portuguesa um pouco conservadora e moralista. da mesma forma que hilda hilst, a moral portuguesa ajudou a matar um pouco al berto. creio que no sentido de uma linguagem mais despojada e moderna, o brasil evoluiu mais, talvez pelo fato de abrigarmos várias culturas. isto ajudou. às vezes acho os autores portugueses um tanto moralistas. aqui no site mesmo isto é visível. o que vejo de vanguarda aqui, posso citar sem medo: a prosa sua, do josé torres e do antónio paiva; a poesia de bruno sousa villar - uma agradável surpresa -, margarete, também na prosa, embora tenha muito a evoluir, é jovem demais, e wiscat, cuja poesia me surpreende pela pouca idade que tem. veja você: escrevi a palavra boceta num poema que li várias vezes em público aqui no brasil. no site foi motivo de escândalo, mas acabou tornando-me conhecido, fazendo com que eu passasse a ser um dos brasileiros mais lidos e comentados. a palavra boceta está no Poema Sujo, de Ferreira Gullar, considerado o maior poeta vivo do brasil em atividade. neste sentido, acho portugal ainda um pouco moralista. mas por outro lado, portugal tem por seus poetas o respeito que nós, brasileiros, não temos pelos nossos. grato pelas suas palavras. afeto, admiração e amizade,

júlio s.

minha irmãzinha,

não se trata de genialidade. isto são os olhos da sua bondade que assim enxergam. acredito que o lado mundano e detalhista da minha poesia deve-se à minha atividade como jornalista, que muito me ajudou.cenas como as descritas neste meu poema cansei de presenciá-las n noite. o publicitário decadente, por exemplo, que aparece nesta versão com os envodcados e não encachaçados, como reza a forma original - em portugal, muita gente não sabe o que é cachaça - pode ser um jornalista. e no caso eu mesmo, que tantas vezes, mesmo sem querer fui e sou personagem das minhas histórias e poemas. durante dez anos escrevi crônica diária num jornal. e os temas eram estes - flagrantes do submundo e do dia-a-dia dos mal-amados e das mulheres tristes.

meu afeto de sempre, núria. carinho e admiração,

júlio

Olha, Karla, em matéria de bar sou um expert. E você está coberta de razão - consultórios, sim; peitos e mentes rasgados, também. Mas o pior é que despido do que há no bolso, isto é inevitável.Um amigo meu, jornalista também, criou um provérbio sobre o assunto: "Entrar no bar é fácil. Difícil é deixá-lo com dignidade.

afeto,

júlio s.

grato mario pelas palavras. mas por aqui, acho que você não sabe, já baixaram traficantes de poemas alheios. recentemente, uma certa senhora andou a fazer isto. mas bateu em retirada. parece que traficou poemas de uma autora consagrada aí em Portugal. e foi descoberta.

abraço, amigo.

júlio s.

Camarada Edilson, desculpe. Só agora pude ler o seu comentário. Ando distraído até comigo mesmo. Bar é isto mesmo. Ou um pouco mais talvez. Ainda bem que eles existem para acolher nossas mentiras e desesperos.

abraços,

júlio