Poemas -> Dedicatória : 

Poema V A Federico García Lorca

 
Companheiro, morto desassombrado, rosácea ensolarada
quem senão eu, te cantará primeiro. Quem senão eu
pontilhada de chagas, eu que tanto te amei, eu
que bebi na tua boca a fúria de umas águas
eu, que mastiguei tuas conquistas e que depois chorei
porque dizias: “amor de mis entrañas, viva muerte”.
Ah! Se soubesses como ficou difícil a Poesia.
Triste garganta o nosso tempo, TRISTE TRISTE.
E mais um tempo, nem será lícito ao poeta ter memória
e cantar de repente: “os arados van e vên
dende a Santiago a Belén”.

Os cardos, companheiro, a aspereza, o luto
a tua morte outra vez, a nossa morte, assim o mundo:
deglutindo a palavra cada vez e cada vez mais fundo.
Que dor de te saber tão morto. Alguns dirão:
Mas se está vivo, não vês? Está vivo! Se todos o celebram
Se tu cantas! ESTÁS MORTO. Sabes por quê?

“El passado se pone
su coraza de hierro
y tapa sus oídos
con algodón del viento.
Nunca podrá arrancársele
un secreto.”

E o futuro é de sangue, de aço, de vaidade. E vermelhos
azuis, braços e amarelos hão de gritar: morte aos poetas!
Morte a todos aqueles de lúcidas artérias, tatuados
de infância, de plexo aberto, exposto aos lobos. Irmão.
Companheiro. Que dor de te saber tão morto.

In: "Poemas aos homens de nosso tempo”, Ed. Globo, São Paulo - 2003.





Hilda Hilst
( 21/04/1930 — 04/02/2004)
Autores Clássicos no Luso-Poemas

 
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Hilda Hilst
 
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Enviado por Tópico
Julio Saraiva
Publicado: 25/10/2009 10:58  Atualizado: 25/10/2009 10:58
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Mensagens: 4206
 Re: Poema V A Federico García Lorca
Ué, ela levantou do túmulo, lá em Campinas onde está enterrada? Que eu sempre soube, ela costumava falar com os mortos pelo rádio. Agora, com negócio de psicografia ela nunca se meteu. Em todo caso. E esta foto tem, no mínimo, cinquenta anos.

júlio