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Crônica Cotidiana

 
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Ao fundo surgia uma música já conhecida...
Vinha do quarto.
E eu, parado, quase estático, quase nu... Dentro do banheiro a quase uma hora, olhando para o chuveiro, como se esperasse o inverno passar para que pudesse lavar meu corpo e alma no banho noturno que antecede o descanso. O frio encovarda.

A casa, já delimitada pelo cotidiano, é tão normal quanto a rua, as pessoas e o mundo que me rodeia. Já não enchergo alegria nas coisas simples... talvez eu tenha a perdido num desses dias de incerteza que me assombram. Mas ao menos algo de bom me tem ocorrido: o medo traz reflexões que jamais conseguiria em outro momento.

Luzes apagadas e mente elevada em busca de respostas, como se o tempo fosse piedoso a ponto de arrancar-me a ansiedade e mostrar seus caminhos. Ele é paciente, quase doentio.
Nunca se apressa, a não ser quando estamos felizes.
Então a noite se espalha dentro de mim, como se o dia já não quisesse mais existir.

O sono já é tão denso que pesa as pálpebras, mas ainda não consegue vencer a força do pensamento, que se fixa no nada e nos sonhos.
A vida passa como num filme, mas tudo é tão longe da realidade que me falta coragem de dizer.
As idéias florescem, poeticamente, hermeticamente... Mas não há caneta nem papel, nem força alguma de se levantar, acender a luz e registrar o que se passa.
Uma idéia foge... e talvez nunca ninguém poderá ouvi-la.
Mas sei que em algum lugar, aqui dentro, ela ainda existe e estará guardada, como se guarda o amor pelas coisas boas.

Está tão tarde e ao mesmo tempo tão cedo... afinal, o dia simplesmente acabou de começar, e o mundo acabou de deixar de existir do modo como eu o conhecia.
Atribuo novo sentido para coisas que sempre tive como imutáveis...
Viro e reviro-me pelo avesso, fecho os olhos que já não enxergavam, pois a escuridão não os permitia. (Mas nem é culpa da tal escuridão... é só a falta de algo tão comum no qual chamamos Luz). Acho que é disso que muitas almas estão precisando.

E quando vem o sono, o sonho, a fuga do real para o vago, espaço sideral, sono insaciável, Mundo dos loucos.
Então cessa a vida, só por um instante, um momento, um infinito.
E já posso acordar de manhã, tão cedo quanto me deitei, e caminhar de cabeça erguida e de sorriso imponente.
Mesmo que cá'dentro ainda paire aquelas dúvidas que só o tempo será capaz de dizer, se vou ou se fico, se ofusco ou se brilho...

E o Mundo, tão naturalmente, continua, como se eu não existisse nele e nem ele em mim.
E no fundo aquela mesma música, que coloquei pra tocar repetidamente, com seu refrão tão confortante e que toca meu íntimo descuidado, ainda ecoa.
A casa, a rua e as pessoas ainda são as mesmas...
Só eu que mudei, da noite para o dia, a maneira de vê-las.

 
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Maxximos
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