Poemas : 

Na esteira das hélices dos submarinos

 

"...contrastando com a blusa azul agarrada
revelando sensuais contornos do seu corpo...

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Na esteira das hélices dos submarinos

Na esteira das hélices dos submarinos,
um segredo nidificado, hermético
como respirar sob as águas
após vinte anos de solidão,
lendo um romanceiro gitano,
a chorar para uma lua cruel
com seios de frio estanho.

Sequer me lembro de um seu sorriso,
ou se em sua cidade fazia calor,
mesmo se os carros levantam poeira
em estradas municipais esburacadas.
Urbe estranha, num tempo escatológico ocioso,
quando entrei nessa cidade, no museu,
repleto de relíquias góticas, vasto cabedal,
com você, como guia ocasional.

Talvez não esqueça aquela rua de paralelepípedos,
aquele encontro meio furtivo,
regado a quartzo, feldspato e mica,
sob uma exuberante quaresmeira roxa,
de flores aos cachos carregada,
contrastando com a blusa azul agarrada
revelando sensuais contornos do seu corpo.

Neste corredor de submarino inclinado,
sobre canos de óleo diesel alifático
fluem benzenos aromáticos
embalados pelas ondas ao som do arco-íris
espalhado logo ali na minha frente.

É uma visão despretensiosa,
observar sob outro diapasão
tudo o que era sem nunca ter sido,
e mesmo assim um dia foi seu,
outro dia era de nós dois, porém,
hoje, tudo isso não tem dono,
nada não é de mais ninguém.

Perdoe-me por contar a todos,
havia prometido calar-me sobre isso,
renunciar àquela outorga uxória,
despojar-me de todos nossos bens comuns.
Mas, se pouco se tem dado a nós
neste curto espaço do nosso conviver,
ao menos tivemos jantares para dois,
assistimos mais de um bom filme,
mesmo esperando quase duas horas
para entrar na fila das pipocas.

Mas, na verdade, tudo isso é passado,
já ocorreu há muito tempo,
sequer me lembra o nome dos filmes.
Sei que um deles era sobre um herói
que depois de morto foi montado,
lança em riste, escudo apoiado,
e cavalgando Babieca, avançou sobre sarracenos
enquanto uma Ximena lacrimosa,
com feição de Sofia Loren
aceitava a viuvez com resignação.






" ...descrevo sem fazer desfeita,
meu sofrer e meus amores
não preciso de receita
muito menos prescritores."




 
Autor
LuizMorais
 
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