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O reverso da medalha

 

“... poder discricionário não se confunde com poder arbitrário. Discricionariedade e arbítrio são atitudes inteiramente diversas ”
( Hely Lopes Meirelles)



Temos assistido nos últimos tempos diversas reformas na legislação penal e que realmente traduzem-se em conquistas. Mas o que se ve-rifica é que tais reformas e alterações, posto que ditas liberais e frutos do pleno Estado de Direito vigente desde o advento da Cidadã, praticamente somente atingem a Polícia como instituição, na tentativa dos autores daqueles dispositivos em restringir ações isoladas de determinados setores da polícia que abrigaram alguns policiais e que via de regra foram seus algozes na época da ditadura, de infausta memória.

Na ânsia de eliminar para sempre qualquer resquício do ranço do autoritarismo e de sua polícia política, tem-se criado mecanismos que em muito beneficiam os criminosos comuns fortalecendo o poder das quadrilhas organizadas e desestabilizando o aparato policial.

A Polícia Civil é feita de homens e mulheres provindos de todas as classes sociais e que pelo simples fato de ingressarem nesse órgão, não perdem as suas características de seres humanos como querem incutir nas mentes da população alguns dos legisladores, principalmente alguns mais extremistas e que ao legislarem, tomam o conteúdo pelo continente e numa clara inversão de valores, contaminados pelos anseios revanchistas inerentes à pes-soa humana, generalizam ações particulares refreando a ação da Polícia como aparato repressivo que evidentemente deve ter para que possa desempenhar a sua função.

Após a queda dos ditadores de plantão sempre se promove um expurgo nas polícias políticas, mas não me consta que a polícia alemã voltada para o combate ao crime fosse dissolvida após a queda do 3° Reich, ou que a polícia russa não sobrevivesse a Ieltsin. Pelo que consta, até a KGB so-breviveu.

Ocorre que, os legisladores esperam refrear ações isoladas de alguns policiais opondo freios a toda instituição, correspondendo a uma ação em que aos parlamentares em geral fosse defeso, a partir de determinada data, apresentar emendas aos orçamentos, para impedir que casos como os já conhecidos ocorressem. Não é possível restringir a ação de todos os parlamentares pela ação isolada e criminosa de alguns e o mesmo ocorre na instituição policial.

Todas essas variáveis introduzidas e que restringem a cada vez mais a ação das polícias vem gradativamente solapando as bases do sistema repressivo e fatalmente resultará no aviltamento das fileiras, reduzindo a instituição num extremo, a um punhado de abnegados idealistas, intermediando uma massa de acomodados sem coragem para reagir e enfrentar as situações e noutro extremo os desonestos, truculentos e “picaretas ” de sempre e que existem em todas as classes profissionais.

Urge que se abstenha da edição de restrições, pura e simplesmente, sem a imediata edição de dispositivos que, em contrapartida fortaleçam a ação da Polícia e não do policial, alternando nesse caso retirada de prerrogativas e proteção, estabelecendo um equilíbrio na resultante das forças empenhadas no desigual combate no qual, infelizmente, a cada dia, a instituição policial perde precioso terreno.

E de passagem, diga-se que posto que cidadãos brasileiros, aos policiais não tem sido levados em conta o disposto no artigo 5° da C.F./88, garantindo pelo menos a imagem dos que desejam uma sociedade mais justa, diante de seus familiares e da população.

Tendo como exemplo os frequentes acontecimentos envolvendo atrizes e modelos e seus infortúnios quando submetida a uma lipoaspiração, jamais a grande imprensa referiu-se ao caso como “medicina imperita” ou “erro da medicina” e sim como “erro do médico ou da clínica ” ou “ negligencia do médico”. Em contrapartida, aos acontecimentos envolvendo a instituição policial estampa-se desde logo a garrafal manchete “ POLICIA CORRUPTA “, “POLICIA MATA...” e outros tantos impropérios, ao invés de “ policiais corruptos ” e “ policiais matam...”.
Há algum tempo , entre sugestões apresentadas até por diversas entidades defensoras dos direitos humanos, entre elas, paradoxalmente, a volta da censura ao reivindicar “acompanhamento sistemático nas concessões de rádio e televisão. Aplicação da lei penal quando promoverem apologia e incitação ao crime “ e “ ampliação do policiamento ostensivo e preventivo ” reconhecendo até mesmo esses grupos que tiveram pudores em utilizar a palavra “ repressivo ” a necessidade de uma ação eficiente e direcionada.

Tentam parecer simpáticos ao defender salários justos para policiais, como se somente aumento de salários fossem suficientes para valorizar a entidade após o verdadeiro massacre promovido por eles próprios.

Em que pese toda essa situação, esses homens e mulheres, integrantes das mais diversas entidades protetoras dos direitos humanos, re-clamam providências e exigem uma ação efetiva da polícia no combate à criminalidade. Na realidade, com suas investidas atam as mãos dos policiais e após, ironicamente exigem resultados, como se para tratar com marginais armados com granadas e metralhadoras fosse suficiente apenas a dialética do conheci-mento humano como escudo e o estruturalismo de Levi-Straus como arma de ataque.

Resta-nos, pois, uma vez que a iniciativa para inclusão ou alteração dessa legislação é exclusiva da esfera federal, enviar nossos apelos para que envidem todos os esforços para minimizar a situação atual, revertendo um quadro em que nota-se a cada dia mais e mais vítimas entre aqueles que fizeram de seu mister defender a Lei e a ordem pública, na maioria das vezes com sacrifício pessoal.









Alguns fatos citados ocorreram há algum tempo. Este artigo foi escrito e publicado na imprensa paulista no início dos anos 2000, quando o autor era Representante da Associação dos Escrivães de Polícia do Estado de São Paulo e Presidente da Associação dos Funcionários da Polícia Civil de Piracicaba )
 
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LM.remora
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