Crónicas : 

O CARVOEIRO

 
<br />Victor Jerónimo
Portugal/Brasil

Não havia o que comer e beber quase também não.
Era assim até depois da segunda guerra mundial em montes perdidos das Beiras, em Portugal.
A água gelava nas fontes, o frio era intenso e o agasalho muito pouco. Serviam as sarapilheiras de cobertor e os cavacos eram bem poucos para acender o lume.
Havia grandes pinhais, mas estes eram guardados pelos donos e mato não havia, já tinha sido roçado. Os poucos cavacos eram dos donos dos pinhais.
Por vezes lá se encontrava algum tojo para aquecer o lume, mas até esses eram uma raridade. Os carvoeiros precisavam deles para fazer o carvão e não era tarefa fácil.
Iam para os montes, longe das propriedades, abriam um buraco no solo o mais profundo possível e de preferência redondo; enchiam-nos com tojos e caruma. Depois de acenderem o fogo, havia que tapar o buraco com terra, deixando um pequeno respiradouro, para este não apagar. E assim tinham que ficar entre uma a duas semanas perto dos seus buracos, pois havia o perigo de algum ladrão os roubar.
Era assim que o Manel fazia anos a fio. Tinha mulher e seis filhos para criar.
Naquele ano o Manel estava com sorte, o ano estava a ser muito frio nas cidades e a venda do carvão estava em alta. Nesse ano ele tinha começado a fazer o seu carvão mais cedo, mas agora o frio era tanto que ele não conseguiu subir aos montes.
Tinha acabado de regressar da cidade e tinha o produto da venda consigo numa bolsa por dentro das calças e presa na perna.
Escolheu um terreno baldio lá para os lados de uma quinta procurando um abrigo. O frio nesse dia apertava tanto que ele foi recolher-se debaixo de uns beirais da loja da quinta.
Foi aí nesse beiral que o Manel, homem honesto, trabalhador e amigo do seu amigo foi encontrado sem calças e morto.
Hoje o dono da quinta é um rico industrial, que começou a fazer riqueza depois da morte do Manel.
Ele há coisas...

11-02-2004

Publicado como Editorial no jornal “O CANTINHO DO BACALHAU” Recife/Brasil, jornal de circulação entre todas as comunidades portuguesas espalhados pelo Mundo


Victor Jeronimo
(Portugal/Brasil)


 
Autor
victor_jeronimo
 
Texto
Data
Leituras
1157
Favoritos
0
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
0 pontos
0
0
0
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.