Contos : 

Monólogo de uma Árvore

 
Um texto é um monólogo. Tecer palavras é um ato solitário. Não tem diferença com o ato praticado por uma senhora sentada no canto de sua sala, tecendo um caminho de mesa de tricô. Você vê o caminho pronto, não entende os fios trançados, para você são apenas fios.
De uma forma interessante, que um dia vai entender, o universo inteiro é um monólogo. Ela fala com você. Já dissemos isso antes, em outros textos aqui. Os "antigos" sabiam disso. Muitos nativos carregaram com eles fragmentos dessa sabedoria até hoje, trazendo até este tempo, mas pouco disso se sabe.
Uma pedra pode lhe dizer muita coisa. Ela pode, por exemplo, pra quem souber ouvi-la, dizer se aquele solo é bom pra determinado cultivo. Pode dizer se há uma fonte de água próxima ou distante. Pode dizer a você, se perguntar a ela devidamente, até em que estação do ano se está, ou quanto tempo falta para a primavera. Ou mesmo, quando viria a próxima enchente. Stonehenge foi erigido com muito desses intuitos. A própria pirâmide também. São diálogos travados com o universo, quando as pessoas costumavam ouvi-lo. E quando, claro, não existiam calendários e nem mesmo nomes para as estações.
Pare um momento, de frente a uma árvore, ouça as coisas interessantes que ela tem a dizer. Ela pode lhe dizer muita coisa a respeito do seu mundo, da estação do ano, da localidade geográfica que se encontram, do nível de poluição a que estão expostos, da qualidade do seu ar, do índice pluviométrico e até mesmo a hora do dia... Mas não é isso que quero que ouça.
Chegue um pouco mais perto. Ouça o sussurro dela. Existem coisas profundas que ela pode lhe contar, se lhe interessar. Mas vamos te ajudar no início, e vamos enumerar alguns, para que possa te dar um ponto de partida válido.
Uma árvore surge de uma pequena semente enterrada num solo, ela se ergue em busca da luz. Talvez você possa ter percebido a metáfora válida nessa figura, mas isso não é uma metáfora, a árvore não escreve textos. E, assim como o seu eu surge de um inconsciente profundo e segue na busca de novos horizontes e de uma luz, ela também faz o mesmo.
A forma ramificada adotada pela árvore, raízes e galhos, ligados por um tronco, ilustra a sua medula espinhal. Raiz primeira do seu inconsciente coletivo. Pois o centro nervoso central humano tem a mesma consciência profunda e universal de um vegetal.
A forma ramificada de uma árvore, é a mesma forma que adota as veias de seu corpo, as células de seus ossos, e até mesmo as minúsculas células de seu cérebro. A vida flui por ela não apenas na forma de fluídos, como faz o seu sangue. Mas também em forma de energias bastantes semelhantes à energia elétrica que governa os seus pensamentos. A própria eletricidade, sem um meio condutor, manifesta-se à maneira de uma árvore bastante ramificada.
As árvores dão frutos como vocês. O princípio reprodutor delas é tão semelhante, que sêmen vem da palavra semente, e o feromônio do ser humano lembra o odor da madeira. Seus melhores perfumes são almiscarados. O ser humano tem muito do reino vegetal em si. O sistema nervoso autônomo é uma herança do reino vegetal.
Mas as semelhanças não param por aí. Existem coisas ainda mais profundas a serem ditas... O desenho de uma árvore não apenas representa o mapa genealógico da espécie humana. Como a sua herança e forma espiritual também. Imagine que o seu Eu superior seja uma árvore. Cada pequeno ramo num galho é uma experiência dele, sem deixar de ser ele, pois um ramo, ainda que pequeno, é uma árvore. Cada tortuoso ramo segue para um lado, isso não apenas dá forma a árvore, como torna ainda mais exuberante a sua copa. E quanto mais exuberante, mais linda e completa a árvore é.
Em cada pequeno ramo cresce singela uma flor.
Essa flor irá se desprender na estação certa... trará dentro dela todas as informações da árvore original. Crescerá em outro solo, tornando-se outra árvore, com as suas próprias características e experiências. Dentro dela, sem dúvida, ainda estará a árvore que lhe dera origem, mas agora ela será única, porque terá seu próprio solo para crescer.
Quando ela se tornar árvore também, exalará as suas próprias flores, que crescerão em seus próprios solos... E então, o que era uma planície desolada se tornará floresta. Dentro de cada flor há a informação da árvore original, vocês chamam de Dna, a árvore original vive as vidas de todas as suas flores.
Não são só as plantas que lhes contam essas histórias. Elas vêm de todos os lados, de todos os códigos possíveis. O Criador colocou a sua assinatura em todas as suas obras. Você não deve achar que está sozinho, o universo sempre falou contigo.
Como um texto, ou um monólogo, você é um fio numa trama. A sua própria realidade, tudo aquilo que julga como um universo inteiro e interminável, é apenas um fio numa trama. Se você entende de tricô, não se sentirá ofendido em ser um fio, pois uma tela sem um fio, é uma trama incompleta e estragada.


j

 
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London
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